quarta-feira, 3 de julho de 2013

A doença da leitura



Quando eu era bem mais jovem do que sou hoje e morava com minha mãe, era uma cena irritante para minha mãe me ver lendo. Lembro que uma vez, num acesso descontrolado de preocupação quanto ao que via de indícios de baixa competitividade em mim, ela abriu a porta do meu quarto, em que eu estava sentado na cama, ouvindo uma música, com um livro aberto nas mãos, e me questionou: "você pretende passar a vida assim: lendo e ouvindo música?". Quando seguiu adiante, abaixei o livro e me observei com um acento forte de culpa: na verdade, de forma consciente ou não, esse sempre foi o projeto da minha vida. Ainda hoje, me vem ressaibos infantis dessa culpa, quando, em minha biblioteca, eu paro momentaneamente a leitura e me analiso pelos olhos da minha genitora. Há sim uma carga de preconceito por parte da minha família, que pode parecer estranho num primeiro momento, quanto à minha propensão incurável para a leitura. Analisando essa rejeição mais detidamente, soa natural que eles vejam o tempo gasto na inércia diante um livro como uma descompensação monetária criminosa em que eu poderia estar honrando a tradição do clã pela política canalha, pelo comércio, pela advocacia inescrupulosa, pela ascensão social de parecer ter um glamour convidativo que leve sempre a um indeterminado investimento dos mais ricos em você. Essa foi_ se eu tivesse que resumir um tanto de traumas por minha negra ovelhice para um psicanalista_ o maior dos muros para a minha emancipação, a barreira mais espessa que tive que atravessar para me tornar independente e seguir a vida do meu jeito.

Sou visto pela minha família como um pai fundamentalista. Tive brigas homéricas e as venci todas para firmar que eu crio meus filhos da minha maneira. Hoje, quando meus filhos passam um final de semana sem mim na casa da minha mãe, é com uma infinita cautela que minha mãe e minha irmã (que moram juntas) perguntam à minha esposa sobre se é permitido ou não determinado tipo de comida, ir a determinados lugares, comprar determinados brinquedos. Minha análise de meu passado me mostra a surpreendente (para mim) verdade de que, por debaixo de minha total aparência de passividade e submissão e silêncio quanto aos anos em que vivi dependente de minha mãe, havia sim uma estratégia militar da minha parte para sair daquele ambiente: havia um cálculo subliminar muito sério que me deixa um tanto orgulhoso daquele jovem de cabelos compridos e desmanzelado que eu era. Uma das minhas lembranças recorrentes de meu tempo de universitário é um incidente trivial: eu andava em direção ao centro comunitário do campus, em total aleamento, quando um professor me parou com ar bonachão e me perguntou: "Porra, porque você é tão triste?". Isso me atordoou porque nunca me passara pela cabeça o exercício de tentar me ver como os outros me viam: sempre tive como certo a minha inexorável alegria, mas a leveza que eu apreendera dos meus anos de leitor (o paradoxo socratiano nada paradoxal de ver que tudo é de uma banalidade e de uma inapreensibilidade redentora) só era um fato para mim; para os outros, eu tinha algo de filósofo rembrantiano precoce (lembro das gargalhadas de um namorada, que a levou a um engasgo com um copo de água, quando, segundo ela, minha cara de extrema seriedade se desvaneceu quando passei a assobiar o tema do desenho do fantástico mundo de Bob). Lembro que, já formado e trabalhando na minha área, uma colega de classe com a qual só troquei, nos cinco anos de universidade, umas poucas palavras cordiais, me disse, no meio de uma jornada de exames profiláticos que fazíamos em algumas granjas de suíno, que sempre havia me visto como um cara banal, sem conteúdo, o mero agente cotidiano do status quo, e que se surpreendeu quando um outro colega lhe disse que eu era o cara que ele conhecia que mais entendia de música. Então esse é mais um sinal emitido pelo meu mundo espiritual, pensei, mais uma onda de rádio vindo desse distante ambiente interior do qual vou dando as caras. E é por isso que pareço tão radicalmente obtuso na criação dos meus filhos, para minha mãe e minha irmã e o resto da família (se bem que o resto há muito já atingiu o estágio benéfico de só pensar em mim nos atos sociais de escrever um plástico elogio no Facebook): porque descobri que os anos de isolamento contra a morte e a corrupção que passei trancado em um quarto no apartamento da minha mãe, ou em uma praça, ou em tantas bibliotecas acolhedoras ao ócio de final de tarde, trouxeram, afinal de contas, a sua resposta efetiva, foram trabalhando na surdina, como um troféu bíblico insuspeitável, para me transformar em um produto humano moldado na forja de concepções da infância bastante ingênuas mas que foram respeitadas pelo que fui me tornando paulatinamente como num código de fidelidade sério, que nunca aceitou a zombaria pejorativa que me envolvia.

Eu sempre tive o medo de que essa voz depreciativa da minha mãe se infiltrasse entre eu e meus filhos. Quando os pego no colo, atendendo ao pedido deles de que eu leia para eles, às vezes vem a visão discriminativa da minha mãe sobre os mais que dúbios benefícios de levar seres numa idade exponencialmente antenada para o aprendizado do mundo a se afundarem na leitura. Meu senso de paternidade dispara com uma incrível imparcialidade diante o que seria melhor para eles, mesmo que o melhor seja a contramão do que é o melhor para mim. Meus filhos dispensam a televisão para folhearem livros. Minha esposa me disse que eles estão se tornando piores do que eu, o que me dividem o orgulho e o receio. Algumas vezes eu tenho que pedir para eles me deixarem em paz (com jeito), porque sempre estão com livros e solicitando meu colo. Na livraria da minha cidade, eles se sentam nos banquinhos e ficam falando na selvageria deliciosamente sem pompa das crianças sobre os livros que pegam nas estantes, completamente abduzidos pela felicidade e deslumbramento, como se os livros fossem brinquedos fascinantes, o que me deixa mais uma vez apreensivo, pois, agora tendo aprendido a me ver pelos olhos dos outros, me policio se os outros não encararão isso como esnobismo, elitismo ou o que seja: só sei que vou rindo constrangido, freando meu júbilo, quando eles pegam um voluminho de pinturas e gritam: "papai, a Mona Lisa! O Van Gogh, papai!".

Ouço o engulo silencioso da minha mãe e da minha irmã quando elas pedem para falar com o Eric e a Júlia, e recebem um lacônico "eu estou lendo" da parte deles. Uma das últimas vezes que minha irmã nos visitou, eu agi bastante mal: ela, entusiasmada com uma súbita ideia, disse que iria comprar um conjunto de fogãozinho e panelas para a Júlia, ao que eu, instintiva e rispidamente, disse que esse tipo de brinquedo não entra aqui em casa. Ela emitiu um extenuado "por que não?", beirando ao extravasamento da revolta, "é apenas um brinquedo, só isso". Ao que eu caio na sandice sem volta de tentar lhe responder que nunca um brinquedo é só um brinquedo, que estamos num mundo de dominação e imposição de castas, e que as crianças são os principais alvos (a mente trabalhando à toda, pensando que, se minha irmã tivesse a mínima propensão a esse tipo de diálogo, poderia lhe falar sobre os textos sobre brinquedos de Walter Benjamin, e sobre o apascentamento da indústria cultural em estabelecer os meninos como guerreiros urbanos com seus carrinhos e suas pistolas de plástico, e as meninas como domésticas reprodutoras com suas bonecas e fogõezinhos inofensivos), mas o que consigo é apenas ser um bruto sem educação que leva minha irmã a um ataque de choro. Diante o estrago já feito, eu tenho o sangue frio de reconhecer que aquela é mais uma das ocasiões em que tenho que manter meu poder e ser intransigente, para firmar que de nada adiantam essas tentativas de chantagem emocional para relativizar meu modo de educar meus filhos. Minha irmã arruma as malas e diz que vai embora, minha esposa pede para que eu lhe peça desculpas mas isso só me faz ficar ainda mais parecido a uma pedra; afinal, ela não vai embora, mas passa o final de semana amuada comigo e vamos nos aproximando pouco a pouco.

E na verdade, o que vejo é que estou criando meus filhos para serem preparados para um mundo que me parece avançar para um lamentável nó de instabilidade e incertezas. Na verdade, minha irmã é uma antítese e um modelo parcial do que pretendo que meus filhos venham a ser. Antítese pelo que ela tem de um inconsequente desconhecimento do mundo que vai além do perímetro de sua atuação profissional e pessoal cotidiana, uma alienação completa sobre a história, o passado, sobre as nuances. Modelo porque minha irmã, tanto quanto minha mãe, são trabalhadoras acirradas, ainda que limitadas pelo molde compulsivo de trabalho-trânsito-casa. Falta-lhes em absoluto uma riqueza interior, darem-se bem consigo mesmas. Minha irmã não tempo para nada. É uma moça linda, de caráter, pragmaticamente deu mostras de ser mais incorruptível do que eu. Quando eu estava desempregado, há dez anos, fui condicionado por minha mãe a pedir algum tipo de auxílio para meu tio, irmão da minha mãe_ a ideia hoje absolutamente suicida de que ele me apresentasse a um dos tantos pecuarista amigos dele para que eu exercesse meus préstimos de veterinário. Ele ficou me enrolando por um mês, em que me chamava ao escritório, e uma noite me levou para a casa dele, em um condomínio fechado de alto luxo (era vizinho do sr. Cachoeira), e propôs, numa estranha brincadeira, para que eu dormisse no carro_ o que não procedeu, pois ele riu e disse que estava brincando. Mencionei o fato à minha irmã, e ela, horas depois, telefonou para esse meu tio e disse as coisas mais ferinas e insultuosas possíveis. Eu não estava em condições de combate diante a constatação de que meus planos de emancipação estavam indo por água abaixo; o que fiz foi recusar a proposta dele de pagar um curso de direito para mim e me empregar em seu escritório como estagiário e futuro advogado da empresa, o que outros teriam visto como enorme vantagem, e segui meu rumo. Mas minha irmã, como grande parte do mundo, é uma discípula sem a mínima capacidade de questionamento da vida urbana neoliberal de ponto morto. Da última vez em que ela e minha mãe estiveram aqui, ela não desgrudou de seu i-phone. Me pareceu aterrorizantes os sintomas de uma abdução descerebrada que toma conta de todo mundo hoje em dia, o que me fez olhar para meus filhos com os olhos emprestados de minha mãe e pensar; eu deveria direcioná-los para esse fim?, afinal não seria menos doloroso e muito mais cômodo para eles que eles se emergissem para esse anestesiamento casular e vivessem sem se preocupar com as coisas que ninguém nunca vai conseguir mudar? Minha irmã tem um ótimo rendimento mensal, não é esse o propósito da vida? Não é esse o objetivo esperado? Na televisão, um apresentador pergunta em qual país as vacas são tidas como seres sagrados, e minha irmã desvia os olhos por um momento do i-phone (com o qual chama atenção para um jogo estúpido de estourar balões que enebria meus filhos) e pergunta "qual país é mesmo?", ela que sempre foi uma aluna notável, monitora de química e física, de uma disciplina espartana para os estudos, qualidades as quais não obtive nem um quarto da distinção dela. Ela precisa saber de uma inutilidade completa dessas, que serve agora para programas insossos de tardes de domingo? Uma vez, levei ela e um antigo namorado dela para um pesque-pague, e na estrada eles viram uma vaca com um chifre imenso, e se surpreenderam com o fato de que não só o boi tem chifre, mas a fêmea do boi também, e me perguntaram, com um desalento infantil, como chifres tão grandes passavam pelo canal da vagina durante o parto. Eu levei tempo para perceber que eles não estavam brincando, esses exemplares bem sucedidos do homo-urbanus moderno. Mas logo me vi pensando em Sherlock Holmes, ao revelar para um atordoado dr. Watson, em Um estudo em vermelho, que ele desconhecia a rotação da Terra e várias outra informações inúteis, e só ocupava sua mente com coisas que lhe interessavam para sua vida prática. E assim é a maioria, para quem as sutilezas da leitura e de constatações não mais tão naturalmente óbvias sobre a paisagem cercante não representam nada em sua progressão para um posto bem localizado e remunerado na grande fauna citadina. E o quanto as armas de poder de sua rede de conhecimentos faz com que minha irmã esteja anos à frente de mim, muito mais preparada darwinianamente para enfrentar o mundo, quando ela, como um mágico vaidoso, pede para que eu coloque no som a música mais inacessível e desconhecida que eu tenho, aponta em seguida o i-phone para o estéreo, e na tela líquida aparece a foto do álbum, o nome da banda e a música inteira para ser ouvida.

Mas me mantenho teimoso e fiel a intuições arraigadas. Mês passado levei meu carro para a retífica, e eles me devolveram um carro tão potente e novo tal qual quando ele saíra da concessionária, em 1997. Minha irmã vendeu seu carro 2010 e comprou um modelo zero quilômetro, financiando um valor alto em 36 meses. Ainda penso que a alegria é muito superior à felicidade, que aliás essa última não existe, e passar pelo mundo engolindo toda espécie de entregas superfaturadas e falsas para meramente atender a uma necessidade de pertencimento é trair a complexidade que nos é dada no início e sobre a qual, o mínimo que devemos fazer em retribuição, é nos mantermos sempre em um suave, ingênuo e ativo deslumbramento. A leitura sempre me ofereceu esse tipo de inferno: a da consciência do outro, da responsabilidade de não estar-se sozinho no tempo e no espaço. E se tudo correr bem, as derivações pelo caminho não sendo muito sinuosas, meu filhos continuarão recebendo esse presente.

P.S.: deparo com a “homenagem” do Google aos 130 anos do aniversário de Franz Kafka, bem ao estilo de mega-empresas da internet que não ligam a mínima para a leitura. Gregor Samsa apresentado como uma alegre barata que adentra pela porta, com pasta executiva, é o supra-sumo atestado de quem nunca leu Kafka. Uma das obras-primas do pensamento moderno transformada pelos eternos adolescentes do Vale do Silício em um clichê vazio e equivocado. Mas tudo tende ao “bonitinho”, e viva o conceito de boutique.

30 comentários:

  1. Putz... Pensarei um pouco e voltarei pra comentar.

    PS:Creio que, até então, é o melhor texto que já li no seu blog, talvez por sintetizar muito do que eu penso e passo sob o olhar dos outros diante do "desperdício" da leitura.

    Ana Paula Rocha

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    1. Imagino que os dilemas sociais do leitor são os mesmos, Ana. Mas não me iludo: a leitura é sim um eficiente meio de se conseguir o que se quer, até em respeito às necessidades neoliberais.

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  2. Me identifico com algumas partes do texto. Rindo até agora do "como chifre passa na vagina"! Pelo menos minha família cuida para não dizer besteira na minha frente, sempre com receio de que os corrija.
    Como não acordei de mal humor, não havia feito essa análise sobre a homenagem do Google, mas concordo com ela.

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    1. Claro que o Google também presta um serviço ao interesse insurgente da leitura, com essas homenagens a escritores, ainda que muitas vezes totalmente por fora. Mas me agarro ao direito da crítica de um aficionado; a mesma coisa faria um torcedor de futebol se visse o Neymar sendo retratado com a camisa do Inter, ou coisa que o valha.

      Achei interessante o detalhe da maçã, em referência ao objeto que jogam em Samsa e fica preso no seu corpo de inseto.

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  3. Sobre enfermidade literária, escrevi aqui: http://cassionei.blogspot.com.br/2012/01/falando-sobre-minha-doenca-no-tracando.html

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  4. Posso adicionar mais uma pedrinha ao seu fundamentalismo na criação dos filhotes?
    Um dos meus textos preferidos de Roland Barthes, em Mitologias, "Sobre Brinquedos,"

    JUGUETES
    El adulto francés ve al niño como otro igual a sí mismo y no hay mejor ejemplo
    de esto que el juguete francés. Los juguetes habituales son esencialmente un
    microcosmos adulto; todos constituyen reproducciones reducidas de objetos
    humanos, como si el niño, a los ojos del público, sólo fuese un hombre más pequeño,
    un homúnculo al que se debe proveer de objetos de su tamaño.
    Las formas inventadas son muy escasas: algunos juegos de construcción,
    fundados en la tendencia a armar objetos, son los únicos que proponen formas
    dinámicas. En todos los otros casos, el juguete francés siempre significa algo y ese algo
    siempre está totalmente socializado, constituido por los mitos o las técnicas de la
    vida moderna adulta: ejército, radio, correos, medicina (maletines de médico en
    miniatura, salas de operación para muñecas), escuela, peinado artístico (cascos
    rizadores), aviación (paracaidistas), transportes (trenes Citroens, lanchas, motonetas,
    estaciones de servicio), ciencia (juguetes marcianos).
    Los juguetes franceses, al prefigurar literalmente el universo de las funciones
    adultas prepara al niño para que las acepte, en su totalidad; le genera, aun antes de
    que reflexione, la seguridad de una naturaleza que siempre ha creado soldados,
    empleados de correos y motonetas. El juguete entrega el catálogo de todo aquello
    que no asombra al adulto: la guerra, la burocracia, la fealdad, los marcianos, etc. Por
    otra parte, el signo de renuncia no es tanto la imitación, sino su literalidad: el juguete
    francés es como una cabeza de jíbaro, en la que encuentra, del tamaño de una
    manzana, las arrugas y los cabellos del adulto. Existen, por ejemplo, muñecas que
    orinan; tienen un esófago, se les da el biberón, mojan sus pañales; dentro de poco, sin
    duda, la leche se transformará en agua dentro de su vientre. Así, se puede preparar a
    la niñita para la causalidad doméstica, "condicionarla" para su futuro papel de
    madre. Sólo que, ante este universo de objetos fieles y complicados, el niño se
    constituye, apenas, en propietario, en usuario, jamás en creador; no inventa el
    mundo, lo utiliza. Se le prepara gestos sin aventura, sin asombro y sin alegría. Se
    hace de él un pequeño propietario sin inquietudes, que ni siquiera tiene que inventar
    los resortes de la causalidad adulta; se los proporciona totalmente listos: sólo tiene
    que servirse, jamás tiene que lograr algo. Cualquier juego de construcción, mientras
    no sea demasiado refinado, implica un aprendizaje del mundo muy diferente: el niño
    no crea objetos significativos, le importa poco que tengan un nombre adulto; no
    ejerce un uso, sino una demiurgia: crea formas que andan, que dan vueltas, crea una
    vida, no una propiedad. Los objetos se conducen por sí mismos, ya no son una
    materia inerte y complicada en el hueco de la mano. Pero esto" es poco frecuente: de
    ordinario, el juguete francés es un juguete de imitación, quiere hacer niños usuarios,
    no niños creadores.

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    1. CONTINUANDO

      El aburguesamiento del juguete no sólo se reconoce en sus formas,
      absolutamente funcionales, sino también en su sustancia. Los juguetes corrientes son
      de una materia desagradable, productos de un proceso químico, no de la naturaleza.
      Actualmente están moldeados en pastas complicadas; el material plástico muestra
      una apariencia grosera e higiénica a la vez, extingue el placer, la suavidad, la
      humanidad del tacto. Un signo consternante es la desaparición progresiva de la
      madera, materia que, sin embargo, es ideal por su firmeza y su suavidad, el calor
      natural de su contacto; la madera elimina, cualquiera que sea la forma que sustente,
      la lastimadura de los ángulos demasiado agudos, el frío químico del metal; cuando el
      niño la manipula y la golpea, ni vibra ni chirría, tiene un sonido sordo y limpio al
      mismo tiempo; es una sustancia familiar y poética, que permite al niño una
      continuidad de contacto con el árbol, la mesa, el piso. La madera no hace daño ni se
      descompone; no se rompe, se gasta; puede durar mucho tiempo, vivir con el niño,
      modificar poco a poco las relaciones del objeto y de la mano; si muere, lo hace
      disminuyendo, no hinchándose, como esos juguetes mecánicos que desaparecen bajo
      la hernia de un resorte descompuesto. La madera hace objetos esenciales, objetos de
      siempre. Ya casi no se encuentran esos juguetes de madera, esos apriscos de los
      Vosgos, que eran posibles, es cierto, en los tiempos del artesano. Ahora el juguete es
      químico, en sustancia y en color; su material introduce a una cenestesia del uso, no
      del placer. Además, estos juguetes mueren muy rápido y una vez muertos no tienen,
      para el niño, ninguna vida póstuma.

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    2. Ôpa, vou ler com atenção mais tarde.

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    3. Muito bom o texto, Luiz. Não conhecia. Obrigado.

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  5. A julgar pelo Milton e você hoje, devemos ter entrado nas comemorações da "Semana da Egotrip".

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    1. E eu pensando que seria assim se eu dissesse que tenho uma Hilux 2013...

      E é impossível escrever sem ter um acentuado nível de vaidade e amor próprio.

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    2. Não seria.

      Você deve se embrar dum textinho do Cortázar, que finaliza dizendo algo assim como "quando dão um relógio de presente a você no dia do aniversário, estão mesmo é dando você de presente no dia do aniversário do relógio".

      Com uma Hilux é a mesma coisa; você não é o centro, mas o carro. Você que terá que dar a ela o prazer de rodar pelas ruas. Você é o passageiro mecânico, ela é a máquina pessoa.

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    3. Pensamos absolutamente a mesma coisa. Nem se eu tivesse condições de comprar uma merda de uma Hilux eu o faria. O que eu quis dizer é que não me parece vantagem, na sociedade atual, alardear ser um leitor.

      Tem outro continho do Nabokov, no mesmo Cronópios, que ele diz sobre um senhor que adquire um relógio novo, deixa cair o pacote e constata que esse mísero acidente destruiu em definitivo o relógio. Não sabe ele, diz Cortázar, mas o milagre havia acontecido.

      Ikaria.

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    4. Estou pedindo o "Contos reunidos" do Nabokov neste instante, pela LC, e confundi os nomes acima. Quis dizer, é óbvio, Cortazar.

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    5. Mas eu acho que o alarde é vantajoso sim, mas para aquele que não lê, e ouve do que lê "Eu leio"; ato continuo, ele passa a descrer no efeito pedagógico da leitura.

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  6. Melhor texto. "Umbiguista", mas coube na Ana, no Cassionei e em mim também. Pena que só fui lê-lo agora. Preciso de um telefone moderno para continuar acompanhando o blog fora de casa. Viciante. VSF, esse Charlles.

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  7. Engrenagem maligna com recursos infindáveis.
    Vou pular bem alto! Quando cair, talvez esmague uma dessas tentações...
    Obrigado Charlles!

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  8. oi, estou no aeroporto curtindo demais esse teu texto, uma espécie de wikileaks da alma, uma libertação. me dá asilo em goiás, aliás?

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    1. Hum... Letras minúsculas e um humor característico...

      Pode vir.

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    2. Posso ir também? Acho que dessa vez nem o TARSO me ajuda.

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  9. O Battisti tem conta no Google, mas o Snowden sabe que isso é maior roubada. Deus me livre se o Julian Assange vazasse minh'alma num blog. Também tenho um carro 97. A diferença é que não foi para a retífica, não tem bateria, tem pneus arriados, está parado há uns três anos e me custa garagem e IPVA. Minha mãe e minha irmã vivem brigando comigo para eu me livrar do Volkswagen 1.0 - mas, ao contrário de você, acho que elas estão certas.

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    1. O meu está uma beleza, tem vidros elétricos, direção hidráulica, ar-condicionado e travas inteligentes (só deixa alguém sair se desligar o motor), e vem com um adesivo no vidro de trás escrito Koyaanisqatsi.

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    2. IPVA? Carros com mais de dez anos de uso são isentos, o que torna o meu ainda mais vantajoso_ não alimento nenhum político.

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  10. Vou me informar sobre o Estatuto do Idoso Veicular do Estado do Rio Grande do Sul (Eivergs). Quem sabe você não me ensina alguma coisa. :-)

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    1. Para carros com mais de dez anos de uso, só se paga o seguro veicular, Fábio. Pode ser que seja uma lei restringida ao estado de Goiás, mas como o mecenas daqui é obcecado por dinheiro, duvido muito. :-)

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  11. Vidros elétricos e direção hidráulica. Sei.

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    1. Não tem muita lógica mentir começando dizendo que tenho um carro 97.

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  12. Conheci um priminho. No museu. Ele estava na sala da imperatriz.

    - O que é isso?
    - É um leque,
    - Ah, le-lek, lek, lek, lek

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