segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Nos Encontramos às Margens do Lago Ness, à Meia Noite


Dos cursos universitários que fiz, por mais vinculados à onda de malucos que são História e Jornalismo, os episódios tresloucados que se seguem são frutos de minha convivência com alguns alunos da planificada e sertanejamente sem graça Veterinária. Estudar veterinária num estado agropecuário como Goiás, e, em contrapartida, ser adepto às ideias livrescas, é algo bem próximo ao martírio. Todos os dias ver caminhonetas da moda chegando nos estacionamentos da escola, ver descendo delas personagens saídos de algum desvirtuado clipe de música country texana, com cintos de fivelas enormes onde se tem desenhado em alto relevo um cavaleiro em cima de seu alazão, sujeitos vestidos com camisas xadrez e chapéus de alguma marca top de linha (e sair por aí utilizando essa expressão tosca: top de linha), é o tipo de espetáculo que me fez várias vezes pensar, desconsolado, que estava perdendo cinco anos da minha vida, de modo muito inconsequente. Sem falar de meu espanto ingênuo em constatar que os cursos de Medicina Veterinária do país são nomeados de forma enganosa, pois pouco tem de Medicina e muito do prepotente conceito do novo latim acadêmico Agronegócio. Esses cursos, pois, deveriam se chamar Agronegócios Veterinários, para fazer justiça ao real objetivo dos que estão enroldados nesse curso, que pouco tem de medicina. Eu mesmo, com toda a minha propalada moral e amor aos animais, vivo de um emprego público em que se matam mil cabeças por dia, e eu sou um dos Agentes Ativos do Agronegócio que fiscalizam nas cabeças e nas vísceras, nos gânglios linfáticos e nos couros e cascos, dessa incomensurável quantidade de animais sacrificados, se há alguma imperfeição que impossibilite seu consumo.

Pois bem, mas o caso não é esse. O caso é que eu me isolava diplomaticamente do restante da turma, de tal modo que, ao almoçar junto de um de meus colegas, no restaurante universitário, e nos falarmos por quase uma hora, esse colega se vira para mim e pergunta qual curso eu fazia. "Ora, Milton, eu sou da sua turma de veterinária!", respondi. Eu era cabeludo, muito magro, os sintomas da timidez voltaram a insurgir em mim, apesar dos dois anos em que o jornalismo me exorcizara, e, como todo aficcionado, era visto sempre com um livro nas mãos, que nada tinha a ver com veterinária. Recordo que, certa vez, eu me deitara na rede emprestada por uma amiga que fazia artes plásticas, e me pûs a ler um romance de William Golding no intervalo do almoço, e varei a lê-lo sem me dar conta de ter começado a aula da tarde. E veio um amigo japonês, que era o primeiro da turma, me chamar para a aula, e quanto foi o seu espanto (quase próximo ao terror) ao não entender o título do livro que eu lia, que era "Visível Escuridão". Ele rodou o livro nas mãos como se fosse uma caixinha musical vinda de um sistema planetário distante, leu várias as vezes o título em voz alta, e me olhava como se visse o quanto havia sido tolo em ter, alguma vez, cogitado que eu seria mesmo um veterinário. Pelos cinco anos, ele sempre me olhava com aquele olhar estarrecido, de que jamais entenderia como eu perdia tempo em ler um...romance?!?!

Daí uma noite eu recebo um telefonema. Ah, aqueles tempos do telefone fixo! Era um colega de turma, do qual já falei aqui algumas vezes, e que tem o raríssimo nome de José. Ele foi logo de cara dizendo: "Você sabe de alguma coisa que eu devo saber! Quero que me conte o que é." E nisso ficamos por duas horas de ligação que me custou um puxão de orelha no final do mês, quando minha mãe viu a conta telefônica. Minha inconsciente imagem errática e reservada despertara no Zé a ideia de que eu era algo como um iluminati. Para disfarçar a magreza_ que era realmente excessiva_ eu sempre usava uns casaquinhos cinzas da Forum por sobre uma camiseta (aprendi isso com o Safatle), e penso que esse aspecto me dava um ar de flautista do terraço, ou alguém excêntrico que agradava ao Zé. (Na verdade o Zé via em mim tudo o que ele era, num exercício de deslocamento vaidoso; era alguém que, à diferença de mim, não conseguia sobreviver na solidão ensurdecedora do curso de veterinária; ele havia vindo de Cuiabá, deixara uma namorada que amava, a família, e era um relações públicas entusiástico demais para suportar morar e transitar pela cidade sozinho.) Quando ele soube que eu tinha a coleção completa dos álbuns do Jethro Tull, aí não deu outra: tornamo-nos unha e carne. Oficializamos a amizade em um final de semana de bebedeira homérica, em que eu levei um puta tombo na portaria de seu apartamento e, para driblar a vergonha por um casal de ar respeitado que saía do elevador e me olhava com recriminação, eu, esticado no chão, ergui as duas cartelas de ovos que levava e que estavam intactos com a queda, e disse a um Zé que não parava de rir: "Cumpra a nossa missão sem mim, Zé, leve os ovos ao seu destino". (E eu tento agora imaginar o que eu fazia com aqueles ovos, mas nada me vem.)

O Zé me apresentou ao movimento logosófilo. Ele era um adepto sincero, estudava livros e livros sobre o assunto. Sua namorada, Moema, era vinte anos mais velha que ele e, quando fui à casa dele em Cuiabá, vi que ela era uma espécie de sacerdotisa do grupo local do movimento. Graças a ele, descobri que em plena Goiânia, há uma pirâmide do tamanho de um prédio de três andares, localizada num terreno de pureza branca onde os rosacrucianos assistem palestras e cumprem seus rituais rotineiros. Descobri que além do Zé, haviam mais três outros sujeitos na nossa turma de veterinária que professavam uma fé descabida a um quarto aluno, de nome Alcemir. Esse Alcemir era uma grande piada, um mestre na mentira, um trapaceiro profissional, mas que só se deixavam se seduzir por sua conversa fiada aqueles que tinham alguma visível insegurança juvenil. Os outros três colegas e o Zé, por mais que fossem brilhantes e gente boa, se adequavam ao perfil de segregados que o próprio curso de veterinária criava. Viviam longe dos pais, estavam estudando o que não queriam, tinham uma série de ânsias de libertação e de conquistas, e o Alcemir catalizou isso com uma eficiência hipnótica. Eles sentiram a necessidade de me trazerem para o grupo, mas antes me estudaram, me faziam perguntas sobre a minha capacidade de guardar segredos de um novo estilo de vida, e coisa e tal. Eu respondia sempre que não curtia a onda homossexual, mas tinha suficiente respeito para conviver com amigos diferentes, desde que não me cantassem. Eles simulavam rir, mas percebia uma tensão em se olharem que parecia dizer: "Esse aí talvez não se adeque, seria melhor desistirmos dele". Mas, quando menos percebi, estava saíndo com a turma. Nossas reuniões eram sempre às 3 da manhã, em locais extravagantes. Uma delas, pulamos as grades do zoológico, e nos reunimos no pátio ao lado do poço das lontras. Um guarda se aproximava, e o Alcemir pedia-nos licença, se levantava e falava alguma palavras cordatas para o vigia, que daí tornava a andar e nos deixava em paz. Uma coisa era certa, o Alcemir era um gentleman, falava compassado, sua voz era musical, andava com a ginga mansa dos Hare Krishnas, e sempre emanava uma assepcia e higiene impecáveis. Conquistara uma das alunas mais ricas da nossa turma, que também estava longe de casa e morava com duas outras amigas, e essa moça, Letícia, fazia o que ele queria. Mas ela só participava das reuniões diurnas dos fins de semana. Outras vezes nos reuníamos em campos de fazendas nas intermediações da cidade, em matas fechadas, num porão da biblioteca da praça universitária.

Entre os ensinamentos do Alcemir, o seu predileto era o desdobramento da consciência. O sujeito tinha que se deitar em um quarto, solitário, com uma meia luz suave, estar em absoluto conforto, com o estômago vazio, e vestido com roupas leves. Daí o sujeito sentia todas as parte do corpo, apuradamente, até que essa lucidez o permitisse sentir o corpo entrando no sono, formigando. O torpor tinha que ser severamente controlado para não afetar a consciênca, senão tudo estaria perdido. Daí, nessas prévias que podiam durar uma hora, o sujeito sentia-se saindo do corpo até boiar próximo ao teto; o sujeito virava-se para baixo e veria o seu corpo repousado da forma que o deixou, e um translúcido cordão umbilical azul ligando-o da testa de sua consciência à testa do corpo. Alcemir alertava: "Cuidem bem desse cordão, para que ele não se rompa; alguns se rompem e a consciência jamais retorna ao seu corpo". Todos treinavam em casa. Eu conseguia chegar até a fase do formigamento, e uma coceira no nariz que sempre aparecia nessas horas me fazia sair do torpor. O Zé me relatou numa manhã, eufórico, que conseguiu voar numa velocidade incrível por sobre a chapada matogrossense, e se viu num quarto de uma moça que também havia saído do corpo e com quem conversou sobre tudo. Alcemir dizia que todos saem do corpo à noite, quando sonham, e os exercícios não eram para tornar o que a própria natureza capacitava, mas para condicionar-se lembrar dos eventos. Numa das últimas reuniões em que participei, ele se virou para mim e perguntou: "Qual o lugar do mundo que você mais gostaria de conhecer?"; eu respondi: "Loch Ness". Ele se voltou a todos os outros e disse: "Amanhã, todos nós, nos encontraremos às margens do Lago Ness, à meia noite".

Eu em esforcei, mas, infelizmente, não pude cumprir o compromisso. Por incrível que pareça, ninguém mencionou o fato nos outros encontros. Alcemir tinha um carinho por minha intelectualidade, gostava de falar sobre livros, quando estávamos reunidos em torno de uma fogueira no sítio do Daniel, um dos nossos amigos, tomando vinho quente (argh! Horrível!). Daniel era seu seguidor mais fiel, e Daniel me dizia que Alcemir havia lido de tudo, pois só bastava posicionar uma mão por sobre o livro e o conteúdo na íntegra se lhe transmitia por osmose mental. Daí eu disse a Daniel que na próxima reunião eu iria perguntar ao Alcemir se ele havia lido Os Acrobatas de Jericó, do grande autor polonês detentor do Nobel, Ocirej Sataborca; e o monumental volume triplo de memórias, As Cinzas de Opel, do escritor judeu asquenaze Lepo Ed Saznicsa. Eu faria o Alcemir tanto dizer que havia-os lido, como discorreríamos sobre as grandes verdades espirituais contidas nesses dois livros, que nunca existiram, que haviam sido inventados por mim naquele momento, e que o nome dos autores eram facilmente desmascarados como um jogo de palavras dos mais fajutos. Dito e feito: quando andávamos por um campo, à noite, lanço as perguntas sobre os célebres pensadores, e Alcemir diz conhecer a obra completa, mas que, pelo menos no caso de Saznicsa, o acha mutilado, um tanto quanto provinciano em sua visão de mundo. Na última reunião em que eu fui aceito no grupo, após Daniel revelar a ardilosidade ao mestre, Alcemir me coloca sentado isolado do grupo, num evidente julgamento, e me lança uma série de acusações sobre minha alma depravada, folgazã, meu espírito de burguês irredimível, e me tasca uma expressão feliz que sempre julguei ser o seu maior achado: eu tinha uma patológica maleabilidade moral.

Um ano depois, a Letícia e o Alcemir sumiram por três meses do curso de veterinária. As colegas não a achavam em casa (Alcemir passou a morar com ela, fazendo as outras amigas que dividiam a moradia abandonarem o apartamento). Corria o boato de que os pais da Letícia haviam descoberto o relacionamento através do aborto que Alcemir impôs à Letícia. Depois, a Letícia apareceu, abatida, com profundas orelhas, muito magra, mas o Alcemir nunca foi visto novamente. Desapareceu por completo, deixando dívidas e um grupo de seguidores que já há alguns meses se distanciavam dele por alguma espécie de enfado tardio. O Zé abandonou o curso, voltando para cuidar da empresa de turismo do pai, que ameaçava cair na bancarrota, em Cuiabá. E eu, arranjei uma namorada doce, fraterna, a qual estava escrito que iria abandonar após três anos de namoro por uma outra que não era nem a terça parte de conforto que ela representava, mas que tinha os movimentos certos das longas pernas morenas.

E me lembrei disso tudo porque, justamente ontem, à meia noite, estava na General Wade´s Military Road, de frente ao Lago Ness, no Google Maps, e brinquei com o acaso de que talvez o que me motivou do nada a procurar aquele endereço fosse um derradeiro contato telepático de um Alcemir que também estivesse de frente ao computador, vendo a mesma coisa, quase vinte anos depois.

16 comentários:

  1. Seria a minha cara seguir o Alcemir. Adorei a história.

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  2. Charlles,
    uma sugestão: batize o seu peru com o nome de Alcemir. Pois ambos os bichos são muito espertos...

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  3. pela primeira vez, devo admitir, duvidei da veracidade do q contas, charlles. acho q por causa desse alcemir, mentiroso.
    mas seria bom demais pra ser mentira. ou tu tem uma grande vida, ou seria um grande escritor. devo admitir q te invejo duplamente? difícil.

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  4. arbo, fiquei tentado a dizer que "la garantia soy yo", mas, embora para as histórias não exista a mínima necessidade de atestados de veracidade, te digo: juro que TUDO nesse texto é verdade. Te dou minha palavra. Ops... uma mentirinha só: o Alcemir não se chamava assim (com a vaidade que ele tinha, não seria difícil recorrer à máxima potência da tal dupla de algaritmos fabulosos do Google para cruzar informações e achar esse texto_ ou talvez por paranormalidade).

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  5. o melhor é qdo acreditamos com o mesmo fervor com q somos levados a desacreditar.
    te acredito assim, por isso sempre volto. abraço.

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  6. Desde os tempos de infância, junto a fulanos em torno de um copo que se movia lenta ou bruscamente em direção às letras recortadas em quadradinhos amiúde (pausa para auto-congratulações pelo amiúde), nunca tive muito saco para holismos em geral.

    Virou preconceito. Respeito, vai. Mas tenho tolerância bem próxima do zero. Tenho que sair de perto. Porque é péssimo fazer piadinha skrotinha sobre questões que não me dizem respeito e não quero que me digam respeito. E me ocorrem mil piadinhas skrotinhas o tempo inteiro. Então, mantenho prudente distância.

    A verdade é que, com o passar do tempo, tenho cada vez menos paciência com os tais holismos. Tenho amigos sinceros que curtem umas bagaças aê. Eles até foram sutis ao me convidar para um ou outro lance: sem insistências. Então, acho que seria meio cretinice minha fazer críticas justas a coisas que eu "não comi e não gostei".

    Dito isso...

    Eu já tive uma meia dúzia de experiências como as relatadas pelo Alcemir. Era nítida a sensação de sair do corpo. Nada de cordão azul, ao que eu me recorde, mas talvez um ou outro filamento incolor - e nem sempre por mim notado. Eu nunca tive pleno domínio de movimentos dentro do quarto, ou da sala, ou do ambiente fechado em que eu estivesse.

    Tipo assim: eu tinha que me esforçar bastante, e sem domínio de aceleração e freio, para me dirigir à esquerda, à direita, acima, abaixo. Ah, mas eu já voei pela Chapada dos Guimarães. Eu dava saltos imensos, de milhares de metros. Ao contrário do ambiente fechado, notei mais domínio de movimentos ao ar livre. Então, eu sempre me esforcei para encontrar a janela ou o basculante aberto.

    Riam: é um trabalhão enorme conseguir sair do teto do quarto, passar pela porta, adentrar no corredor, cruzar outra porta que dá acesso ao banheiro e acertar o exato espaço do basculante do banheiro sem pleno domínio de direção/aceleração/freio no ambiente fechado. E é claro que eu já testei depois: minha cabeça não passa naquele buraco do basculante. Ok, parem de rir. Ou não.

    Curioso é que 100% das vezes, quando eu tentava gritar, ou falar qualquer coisa, ou chamar alguém que estava na mesma casa para que dar uma olhada, eu voltava rapidamente para o corpo. Muito rapidamente. Do alto da Chapada dos Guimarães, eu voltava para Cuiabá em fração de segundo. Maior decepção.

    Eu não sou o Alcemir, juro. Nem sou o teu amigo Zé. E a Chapada, eu sei, tem todo o lance holístico que eu não curto. Há concentração de holismos por lá, o que não torna o local menos incrível. Adoro a Chapada. Detesto o Pantanal.

    É claro que eu acho que a sensação de torpor, em estágio mezzo vigília (ou mezzo consciente), permite esses sonhos-quase-acordados. Não é nada inexplicável do ponto de vista "científico" (argh, tentei evitar a palavra, até porque não sou cientista e nem nunca quis investigar o fenômeno).

    Eu notei que eu posso induzir esse estágio, caso esteja suficientemente relaxado - normalmente sou insone, ideiafix e estressado, ou tomo cervejinha, ou tomo bolinha, então é raro eu estar em condições de induzir qualquer coisa desse tipo.

    Mas sempre que estou relaxadão e me lembro de tentar induzir a saída do corpo, eu tento. Minha receita não inclui música da Ennya, porque nunca foquei num lance seriamente ridículo. Penso nos pés ficando leves, e eles tentam flutuar sem muito sucesso, daí eu sigo para as panturrilhas, sem sucesso, e as pernas tentam flutuar em seguida... daí vou para o quadril, que é o centro do corpo. Até esse estágio, preciso permanecer calmo, nada de euforia "será que eu vou conseguir?".

    Da cintura pra cima, é tiro e queda, não perco mais a viagem. E, olha, é uma viagem. Fantástica. Uma delícia. Eu só preciso parar de querer gritar ou falar durante o transe. Porque eu sempre tento. E sempre acabo melando a história toda.

    Fábio Carvalho

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  7. Fiquei preocupada; achei que o texto seria finalizado com a descoberta, via Google-satélite, da figura envelhecida do Alcemir, à beira do lago Ness, a sorrir para a câmera certo de ser visto por você naquele mesmo instante...

    Não sei se é a mesma coisa, mas tenho um colega professor filiado á logosofia, que ele testemunha ser coisa seriíssima; noutro dia mesmo me mandou um e-mail com uma sugestão acerca de um livro sobre as fraudes da igreja católica, com um título meio engraçado. Não me parece ser uma coisa mística new age. Mas não tenho lá grandes interesses por coisas desse gênero não.

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  8. Seria uma ótima conclusão à história, Rachel. Entre Alan Poe e Ray Bradbury.

    Não coube na simetria do relato, mas eu participei, à época, de muitos cursos de logosofia. Uma coisa há de se dizer em justiça a esse pessoal: eles tem uma preocução estética apurada quanto à escolha de locais romanticamente sinistros e misteriosos, tanto que os prédios antigos com placas de fundação desbotadas nas portarias em que escolhiam para suas palestras dava um clima londrino a tudo. Eles são sérios, com certeza.

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  9. Desculpa, Fábio, mas eu ri. Estou rindo até agora. Mas acredito.

    Por um momento surreal, achei mesmo que você fosse o Alcemir ou o Zé.

    O Zé era idôneo demais para não dizer a verdade sobre suas viagens astrais.

    Eu eu tenho sonhos gratificantes demais sobre voos e esclarecimentos sobre matérias que, acordado, eu não obtenho.

    Mas esse seu comenário é primoroso!

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  10. Caminhante, nada melhor que a maturidade. Um cara incrivelmente sedutor como o Alcemir pode ter alto poder destrutivo. A catarse que meus amigos procuravam para a frustração geral da pós-adolescência não foi tão séria e cheia de consequências como a que teve a Letícia. A propósito, olha só como é a escrita: por 15 anos não dedico um só pensamento ao Alcmir e à Letícia, e desde ontem, quando escrevi numa sentada o post, não paro de pensar neles, com um misto de ternura, nostalgia, e saudade. Me fez lembrar a última página do Apanhador no Campo de Centeio, em que o rapazinho invocado diz que, no final das contas, sente saudades de todo mundo, dos bons, dos maus, dos feios (mas já estou a juntar outra obra).

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  11. Ramiro, boa ideia. Só que faço uma pequena correção: o peru, infelizmente, não é meu_ e nem poderia ser, já que o Miles é um cão sentimental_ mas do meu vizinho.

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  12. Na minha juventude havia mais os seguidores de Carlos Castañeda, entre baforadas de maconha, chás de cogumelos selvagens, porres de qualquer tipo de aguardente e depois, nos cursos superiores, toneladas de Marx e Gramsci para nos trazer de volta à realidade, o que foi inútil na maioria dos casos - ainda bem.

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  13. Hahahaha. Castañeda foi uma febre, eu me lembro enviesadamente, já que peguei os anos finais. Li muito dele, a tese de doutorado que obteve sucesso e se tornou best-seller mundial. Mas o que gostei muito foi o "Portal para o Infinito". Há ali algo de sonho juvenil, possibilidades frescas de mudança, aventura espiritual. Um dia vou me propor a reler agora na meia idade, para ver se restituo alguma filigrama daquela excitação perdida nos diálogos como don Juan.

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  14. Não perca seu tempo. Tenho uma lembrança fresca (sabe-se lá como, depois de tanta coisa) do livro que li como "Porta para o Infinito", e suas teorias e viagens são coisas típicas demais de uma "espiritualidade" que depois se convencionou chamar de "new age". Mescalina e coisas afins dão viagens doidas, mal estar geral, vômitos e destruição temporária de órgão sãos. Beba vinho em quantidades não industriais e a luz aparecerá para você toda vez que chegar em casa e enxergar o interruptor.

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  15. Charlles, acho que vc é a pessoa indicada para sanar minha dúvida...
    É que estou lendo 'O jogo da amarelinha' e não entendi bulhufas da linguagem que o Cortázar criou no livro: o tal do glíglico...

    Rodrigo

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  16. Rodrigo, que bom que está lendo o Jogo da Amarelinha. Não preciso me demorar nos atributos deste que é um dos maiores romances do século passado.

    Minha esposa fez uma faxina aqui em casa e agora há pouco estávamos a ter um entrevero, pois vários livros meus foram mudados de lugar. Não consegui encontrar um livro emprestado por um amigo, o A Violência no Mundo, do Baudrillard, e pûs-me a procurar esse Cortázar e nada. Li esse romance duas vezes, e me recordo que essa lingua foi uma brincadeira erudita de Cortázar para criar uma linguagem própria entre dois amantes. Algo do linguajar urbano parisiense que os exilados do livro ouviam, com misturas de imagens latinoamericanas e tal. Algo que povoa em demasia os livros do Cabrera Infante. Mas não me julgo muito capacitado a ir além dessas impressões soltas.

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