Ah... algumas coisas ainda não se prestam ao riso. Um professor universitário disse em rede nacional que a vida é uma sucessão de agruras. Desde que nascemos somos afrontados progressivamente pelo mundo. Mas o que dizer dessa situação agravante de, assim que nascido, ser atirado na privada, revirar-se o pequeno corpo quase sem peso e quase sem visibilidade pelo tufão da água, descer túnel abaixo e sofrer o drama aparentemente irrevogável de ficar-se atolado no cano do esgoto? Tudo tem seu peso e sua visibilidade, afinal de contas. Isso não é forma de cumprir seu itinerário por esse mundo, por mais minúsculo e infenso que ele seja. Mesmo para essa sutileza complexa, essas pontas soltas de perversão festiva, essa estaca cravada no zero absoluto da falta de dignidade, haverá que se impor um limite. Quem levará a sério que houve uma errática missão ali, mesmo a de se afigurar nas estatísticas dos que morrem antes de completarem o aniversário de um dia? Quem cogitará que houve envolvimento sensorial suficiente para tecer-se uma lembrança, o protótipo de um pesadelo desses que os bebês tem nos berços que os fazem acordar chorando, um pranto desesperado e selvático à busca de consolo, se falta a essa tragédia o mais ínfimo cenário, a mais efêmera contagem de tempo? Nascer e morrer em cinco minutos entre a porcelana com partículas de fezes na superfície da água e meio metro abaixo em um cano de nove centímetros de diâmetro. Nem Beckett pode com isso. Poderia-se criar gerações e gerações de roteiristas de desenhos animados americanos, dos mais politicamente incorretos, dos mais despudorados e chocantemente agressivos, que nem o mais genial deles conseguiria imprimir humor nisso. Ninguém riria, jamais!, por mais que sua cara, quando resgatado pelo grupo de bombeiros de dentro do cano, apareça achatada, branca, perdida entre as incompreensões geométricas da ótica de se saber se se trata de um anfíbio, uma fralda usada, um frango descongelado_ quem teria a disposição certa das retinas para adivinhar nisso um bebê? A cara que simula enfezamento pode parecer a de um palhaço em que lhe jogam uma torta cinematográfica, mas não há a atmosfera de fundo para que os espectadores riem. Quem sabe mais tarde, anos depois, consumadas as previsões clínicas, cada especialista neuromotor e cada autor dos ensaios psiquiátricos comportamentais tenham eles mesmo envelhecidos, em seus trinta, quarenta anos em que ele tenha testado a medida de muitas filosofias para ver se caberiam retroativamente com ele naqueles nove centímetros, alguém possa olhar as imagens e finalmente rir, "ah meu irmão, fizeram uma com você, hein?", "era você?", "fizeram-lhe uma brava". Mas agora não. Todos os rostos, sérios, olhando o frágil pedaço de carne atirado fora, o crânio quebrado, o pequeno pé torto, lacerado e vermelho. Agora não. Em uma sala a mulher que lhe retirou do útero e o fez cumprir a sentença pretendida de uma existência tubular, cujo destino seria nunca olhar a luz. Em outra sala, quilômetros de distância, ele, naquela solidão onde se constroem os futuros e mais terríveis sonhos claustrofóbicos, assistido de hora em hora por pessoas que também vão lhe abandonar, assim que desligado a câmera, assim que reportado sua comicidade seca e intransigente nos noticiários. A vida é uma sucessão de agruras e como ele é sério, como a impenetrabilidade a qualquer riso lhe faz indelevelmente injustificável.
A vida é uma sucessão de agruras e como ele é sério, como a impenetrabilidade de qualquer riso lhe faz indelevelmente injustificável.
ResponderExcluirAmén!
Esse é o tipo de baixeza do qual o homem é capaz que transformara Hayim Nahman Bialik, de poeta lírico, de odes a girassóis que torram ao sol, em Valkíria do pogrom da insignificante Kishinev, na Croácia.
Charlles, leia, se tiver estômago, o poema traduzido do Hebraico para o Inglês "In the city of slaughter" que guarda quase como em polaróide, o exato momento em que o poeta é feito em arauto da miséria humana.
http://www.history.umd.edu/Faculty/BCooperman/NewCity/Slaughter.html
Arise and go now to the city of slaughter...
ResponderExcluirH. N. Bialik (In the City of Slaughter)
ARISE and go now to the city of slaughter;
Into its courtyard wind thy way;
There with thine own hand touch, and with the eyes of
thine head,
Behold on tree, on stone, on fence, on mural clay,
The spattered blood and dried brains of the dead.
Proceed thence to the ruins, the split walls reach,
Where wider grows the hollow, and greater grows the
breach;
Pass over the shattered hearth, attain the broken wall
Whose burnt and barren brick, whose charred stones reveal
The open mouths of such wounds, that no mending
Shall ever mend, nor healing ever heal.
There will thy feet in feathers sink, and stumble
On wreckage doubly wrecked, scroll heaped on manuscript,
Fragments again fragmented—
Pause not upon this havoc; go thy way.
The perfumes will be wafted from the acacia bud
And half its blossoms will be feathers,
Whose smell is the smell of blood!
And, spiting thee, strange incense they will bring—
Banish thy loathing—all the beauty of the spring,
The thousand golden arrows of the sun,
Will flash upon thy malison;
The sevenfold rays of broken glass
Over thy sorrow joyously will pass,
For God called up the slaughter and the spring together,—
The slayer slew, the blossom burst, and it was sunny
weather!
Then wilt thou flee to a yard, observe its mound.
Upon the mound lie two, and both are headless—
A Jew and his hound.
The self-same axe struck both, and both were flung
Unto the self-same heap where swine seek dung;
Tomorrow the rain will wash their mingled blood
Into the runners, and it will be lost
In rubbish heap, in stagnant pool, in mud.
Its cry will not be heard.
It will descend into the deep, or water the cockle-burr.
And all things will be as they ever were.
Dolorosos versos, Luiz.
ExcluirIr dormir com esse excesso de realidade dos telejornais é um tanto difícil.
Pensei em escrever hoje um texto com algo assim, "para quem escrevem Pondé e Safaltle?". Assisti a uma entrevista do primeiro e li o artigo recente no site da Carta Capital do segundo e me peguei questionando para que esse subjetivismo todo. O primeiro confundindo desbragadamente assistencialismo com política de bem-estar social, condenando-os. Safatle com sua teorização fria e sonífera mesclado zizekianamente Lacan com teorias sociais da revolução. Sempre achei um grande achado do Zizék aquele papo todo, aquele estilo próprio, assinatura pessoal, de pautar a luta de classes com herméticas teorias lacanianas. Vale só para ele mesmo, para sua distinção intelectual e para lucrar com isso. Mas não significa bulhufas para ninguém mais. Tudo um imenso pé no saco, se não fosse seu lado de stand-up de soltar aqui e ali umas piadinhas e analisar inversamente filmes piegas de Hollywood. E para quem essas coisas servem? Nossos profetas se transformaram em show-men. Perderam a capacidade extrafísica de se sentarem por cima da torre derruída e olharem Jerusalém sendo destruída mais uma vez.
Falam falam enquanto a caravana do mundo passa, incólume.
Mas... trocando de assunto. Sobre qual ensaio sobre o inferno você se referiu de Borges?
ResponderExcluirCreio que em nosso impensável destino, em que vigoram infâmias como a dor carnal, toda coisa estapafúrdia é possível, até a perpetuidade de um Inferno, mas também acredito que é uma irreligiosidade acreditar nele.
"A Duração do Inferno", In Discussão.
Acho que já havia comentado sobre o poema acima no passado por aqui. Trata-se apenas do início desse terrível lamento escrito pelo então jovem Bialik. Se tiver disposição leia-o na íntegra pelo link.
Interessante que a força do poema não se perde, nem mesmo se o leitor desconhece as circunstâncias históricas desse pogrom de 1905. Há algo incomunicável e ao mesmo tempo universal em certas imagens, como a do bêbe entalado na tubulação de esgoto de um banheiro.
A título de legenda o poema foi escrito depois que o poeta foi comissionado pela associação de pensadores judeus russos (que contava com Simon Frug, o historiador Simon Dubnow, etc) a escrever um relato detalhado, in loci e baseado em entrevistas com os sobreviventes, sobre o massacre de judeus na cidade de Kishinev. Depois de cerca de três meses de estadia na cidade, Bialik, em vez de um relatório, publica esse poema, "Be-'Ir ha-haregah”, poema que castiga a humanidade por tudo que há de abjeto nela, mas que também criticava a passividade do judeu russo. O poema veio a se tornar um canto de resistência política contra futuros atentados contra os judeus; foi lido e usado pela resistência do ghetto de Warsówia e teve usos menos ilustres como no movimento zionista de retorno à Palestina.
Que história! Isso dá um romance.
ExcluirAliás, achei isso muito bom, e ainda não li a Müller:
http://guinamedici.blogspot.com.br/2013/05/tudo-o-que-tenho-levo-comigo.html
Vou reler amanhã esse ensaio do Borges. Programei para amanhã cedo (feriado aqui, prolongado), ver o Laurence da Arábia em blue-ray (estou a passos vagarosos a comprar em blue-ray os filmes da minha vida, e tenho dois: além desse, o Ben-hur, e não encontrei nenhum do maior cineasta de todos os tempos, o Tarkóvski), pela manhã, e o ensaio depois do almoço.
Excluir(Desculpe a trivialidade do comentário acima diante a enormidade do tema do post. Mas, por nossa amizade, só quis dizer isso: amanhã verei o insuperável filme do David Lean, e lerei Borges à noite.)
ExcluirBom, eu tenho uma estima enorme tanto pelo Tabela Periódica quanto pelo Se questo è un uomo. Se é certo que Herta Muller consegue chega perto da memorabilia do inferno que é Se questo è un uomo do Primo Levi, e da ascensão do homem de volta ao patamar de homem, então esse livrinho de Herta Muller precisa ser lido.
ExcluirCurioso aqui. Terminou o Mishima?
Quase por terminar. Muito bom! Não sei se você leu o Jakob von Gunten, do Walser. Esses romances se parecem muitíssimo. Gostaria de saber se Mishima externou alguma influência do Walser.
ExcluirA construção em crescendo do clímax do Romance, o incêndio e destruição do Templo do Pavilhão Dourado, e o final surpreendente são provas pra mim do gênio do Mishima.
ExcluirPERGUNTA E RESPOSTA
ResponderExcluirby Ramiro Conceição
.
.
Às vezes,
olhando-me no espelho,
pergunto-me com terror:
.
“Naquela noite
em Cracóvia
quando cães
fugiram do inferno,
de qual lado
naquele gueto,
na gritaria,
eu estaria?”
.
(O tempo espera-me no instante
e o macabro quieto espeta-me.)
.
Se Poe estiver certo de que ‘tudo
é um sonho dentro de um sonho’
então só resta uma resposta
dentre as possíveis atormentadas:
ser uma impossível...: encantada.
O final do poema ficou a desejar, Ramirex.
ResponderExcluirLuishima, você poderia ser mais específico sobre o que não lhe agradou... Críticas são bem-vindas, pois estou sempre a pensar os poemas. Às vezes, uma simples observação é a pedra de toque que faltava.
ExcluirLuiz, acabei de ler o Mishima. O cara era um gênio. Que romance! O que ressalta e potencializa ao máximo minha incompreensão por seu suicídio de razões estúpidas. Vou ver se faço um texto sobre o livro, envolvendo a leitura de Todorov, "A beleza salvará o mundo". Todorov escreve 400 brilhantes páginas Rilke e Wilde para concluir que quando o artista se leva pela perseguição pura da beleza, ele perde o foco, ele se atrasa um tanto e atrasa todo o mundo, já que poderia ter feito a diferença. Mishima escreve uma maravilha como O Pavilhão dourado, e, em contraposição ao personagem que diz que vai viver, na última frase do livro, ele se mata pelo império, pelo efêmero, pelo que ele julgava, de modo torpe e insossamente romântico, ser a verdade e a beleza. Isso eu jamais conseguirei entender (e desculpar) em Mishima. Isso o faz ser sempre muito "japonês", para mim, muito alienígena. O cara tinha o potencial de Dostoiévski! Isso é um pecado sem tamanho.
ExcluirE olha que não falo pelo suicídio em si. Se ele ao menos tivesse se suicidado pelo enfado, como fez Kawabata aos 90 anos... Mas ele o fez aos 45, e, mais uma vez... em nome do imperador!!!
Se existir um mundo além do nosso em que aportou o decapitado Mishima naquele dia inglório de 1970, imagino-o com a cara de estúpido dos que se apercebem tarde demais que caíram em uma pegadinha. "Olhe para aquela câmera ali, sr. Mishima. O senhor está na Record!"
ExcluirDããã...
Luiz, agora falando a sério. Sua inquietude associada ao final do poema tem sentido. Fui consultar meu alfarrábio poético, um arquivo que contém todos os poemas que escrevi, e lá encontrei, para a minha surpresa, a versão inicial do dito cujo:
Excluir.
PERGUNTA MACABRA
by Ramiro Conceição
Às vezes,
olhando-me no espelho,
pergunto-me com terror:
.
“Naquela noite, quando cães
fugiram do inferno, de qual
lado da gritaria eu estaria
naquele gueto de Cracóvia?”
.
Ou seja, não possuía os 7 versos que constam na versão que postei aqui.Resumindo a ópera, lembrei-me: havia escrito um outro poema com a frase de Poe que me impressionara muito, numa dada época. Desta maneira, como faço às vezes, tentei “costurar” os dois. Daí, creio, que se deu o hiato que você, com extrema perspicácia, percebeu. Efetivamente, o melhor é deixar a pergunta no ar…Além do mais, o título original é superior. Assim, no “Jardim dos Castanhos” prevalecerá a versão inicial, pois, sem dúvida, o texto vai num crescente até que se define no último verso. É isso.
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P.S:
Ai, ai, meu Deus!... Quem diria que o Luiz salvou um dos meus nenês que fora jogado pelo cano da minha incompetência...).
Ramiro,
ResponderExcluirEu definitivamente não sou leitor da sua poesia. De forma que meu comentário foi deselegante. Voltaria atrás se pudesse. Carry on.
Charlles,
Vou aguardar com ansiedade por esse texto seu onde você junta o Todorov ao Templo do Pavilhão Dourado. Eu insisti muito para que você começasse o Mishima, quando começase, pelo "Templo" justamente por conta do inesperado apego à vida do personagem no final da novela. O monge gago do Templo do Pavilhão Dourado mostra quão contraditória e complexa é a vida, como o desejo pela total anulação e dissolução da nossa própria vida, da angústia que caracteriza grande parte da nossa existência adulta, tem que dividir espaço com esse quase tão exasperado apego a viver e seguir vivendo. Isso se aplica mesmo ao Mishima.
Já ouviu falar da versão que explica o suicídio de Kawabata por causa da morte do amigo Mishima? Dizem que Kawabata passou a ser perseguido pelo espectro de Mishima. Que via o fantasma do amigo e pupilo morto no ano que seguiu o seu harakiri.
DOMESTICAÇÃO DE FERAS
ResponderExcluirby Ramiro Conceição
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Não há nenhum problema, Luiz... O que posso fazer? Você não ser meu leitor faz parte do ofício de ser escritor... Por outro lado, lerei sempre com muita atenção as suas reflexões ... Sempre, caro Luiz, embora, como é sabido, tenho discordâncias ao Mishima, não ao seu artista, mas ao seu político.
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Conheci Mishima faz muito… Era uma época confusa, complexa, em que pertenci e depois deixei de pertencer ao MEP (Movimento de Emancipação do Proletariado), organização clandestina à época da “ditabranda” no Brasil… Tal início me tornou refratário a qualquer coisa do nipônico, pois, nas idas e vindas da minha história, aprendi, a duro custo, que não dá pra separar a arte da política!
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Creia-me, profundamente, que se eu lesse a obra de Mishima, que você indicou ao Charlles, minha principal atenção estaria nos pormenores que levou o gestor de tal obra ao fim trágico conhecido. E digo trágico, no mesmo sentido do Charlles: é incompreensível um cara, com a cultura do Mishima, optar pelo suicídio.
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Se eu fosse um cara da área de letras, certamente meu doutorado abordaria, em essência, tal tema. Não dá pra enaltecer continuamente tal loucura. E veja Luiz, tenho profunda admiração, por exemplo, pelo brasileiro artista plástico, Bispo, um esquizofrênico, que por livre e espontânea vontade, à sua época, decidiu ficar internado para elaborar a sua arte. Tal ato político, a meu ver, foi extraordinariamente sadio, por isso, considero a “loucura” de sua arte um grito à libertação humana e, logo, diante disso, me calo!
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Agora diante de Mishima um aristocrata, no seio de sua sociedade, na década de 70, cometer uma sandice de tal calibre que, em essência, defendia passados valores estagnados duma opressora cultura… Ah, não dá, por mais que eu queira!
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Bem, voltando… Luiz, seu comentário enriqueceu muito esteticamente meu livro. Gostaria que você soubesse da alegria que isso me dá... Estou a aprender muito… Ultimamente, recebo trabalhos e mais trabalhos competentíssimos de meus alunos (não estou a dizer que você, Luiz, seja meu aluno, por favor…) tanto ao nível técnico quanto àqueles ao nível superior, incluindo, aí, mestrados... Nunca, Luiz, aprendi tanto em tão pouco tempo... Coisas antes banais tornaram-se sublimes e outras, depois, muito banais... Agradeço à vida por ter me dado a chance à continuidade, pois há muito poderia ter desaparecido tal qual lembra-me a cicatriz do antibraço direito que se refez de nervos, artérias, veias e músculos abertos até os ossos… quanto daquela vez, naquela noite, eram somente meus 35 anos!
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Sim, sou um cão, um ramirex, que conseguiu fugir do inferno por acreditar, sobretudo, que os “seres-humanos” não são destinados à domesticação de feras…
ERRATA: ... os ossos... "quanto"... Por favor, leia-se quando...
ResponderExcluirOlá, Ramiro.
ResponderExcluirSó uma retificação. O Ramirex ali em cima não teve nenhuma conotação canina não.
Não precisa portanto domesticar o selvagem (acho que a referência foi a feras) aqui que te fala.
Que poema terrível, Luiz, tremendo e terrível. Para mim, foi o poema certo na pior hora: última sexta, socorri uma velha amiga, que foi estuprada naquela semana mesmo e até então estava em casa, trancada, sofrendo sem que ninguém soubesse. E eu, que estou no momento lendo Isaac Bábel, outro tremendo e terrível, não conseguia parar de pensar nas grávidas que tanto aparecem nos seus contos, grávidas sempre sozinhas entre cossacos.
ResponderExcluirQuanto ao Mishima e seu suicídio, aprendi com Adrian Leverkühn que o inferno, à sua maneira infernal, também é um famoso fornecedor de bençãos. O que é fraqueza ou doença ou cegueira também é condição de poesia.
ExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ExcluirOlá, João. Li no ano passado uma coletânea da literatura Judaica que figura como resposta a "desastres" da história, onde consta um curto conto de Bábel que versa sobre pogrons russos (me veio aqui na cabeça que ele escrevera também sobre aquele horrível pogrom na sua terra natal, Odessa)
ResponderExcluirhttp://www.amazon.com/Literature-Destruction-Jewish-Responses-Catastrophe/dp/0827604149
O livro é editado pelo Professor David G. Roskies, prof. de literatura Yiidish do Jewish Theological Seminary de Nova Iorque. Foi nele também que eu travei um encontro mais próximo com a poesia do Bialik, bem como com poetas menos conhecidos dos ghettos de Warsowia e Vilna. Poesia terrível como bem colocaste. Escrita sobre e na mais precária das condições humanas. Conhece a poesia de Ytzak Katzenelson?
Se a poesia tem alguma vocação, penso que essa é uma delas. Consolar o inconsolável, enlutar-se com os enlutados...
Sinto muito pela sua amiga...
Bábel é inteiro resposta ao desastre. Em 1920, ele foi correspondente de guerra do partido comunista de Odessa no exército vermelho, especificamente na 6ª divisão - "comdiv 6" - da primeira cavalaria, ou seja, dos cossacos do general maluco Semion Buddióni. Depois de quatro meses de campanha contra os poloneses, Bábel retornou em pedaços para Odessa. Terminei hoje de manhã os contos de "O exército de cavalaria", escrito em Odessa e sobre essa experiência do autor com os vermelhos.
ResponderExcluirEm Bábel, que era judeu, o pogrom não precisa nem ser citado para estar lá. Um conto, chamado "Teoria da tatchanka", descreve o uso de metralhadoras fixadas sobre carroças reforçadas - as tais tatchankas do título - entre os exércitos. Explica que Néstor Makhnó, líder do exército verde ucraniano, deixava de lado tanto infantaria quanto cavalaria, preferindo as tatchakas em seus ataques. Aí que está: Makhnó fez sua fama testando em pogrons suas táticas de batalha. É por isso que o conto fecha com o narrador contemplando um vilarejo judeu destruído, traçando o perfil do judeu camponês.
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Uma rápida pesquisa sobre esse David G. Roskies revela um estudioso aplicado. Vi muitas referências a um livro dele chamado "Holocaust Literature - A History and Guide". Gostei bastante da proposta desse livro e do outro que você citou.
Não conheço Ytzak Katzenelson. Os sites que visitei sobre ele contam que ele compôs "A canção dos judeus assassinados"e escondeu o manuscrito antes de ser transferido de Vittel, na França, para Auschwitz, onde ele mesmo foi assassinado. Pesado.
Grato pelos comentários sobre Bábel. Desconhecia esse envolvimento tão absoluto da literatura dele com o destino dos judeus na Rússia.
ResponderExcluirSe voltar a lecionar o curso em literatura judáica de lamento vou olha-lo com mais atenção.
Roskies vale bastante à pena. Essa coletânea é riquíssima. Ele reúne coisas lá que vão desde a poesia hebraica Ashkenazi até a poesia Yiidish da resistência de Vilna e Warsowia. Coisas que eu considero um triunfo da imaginação sobre a barbárie humana. Bialik reina absoluto nessa coletânea. Não conheço nada mais sublime que Bialik dentro da literatura em Hebráico (malgrado o meu pouco conhecimento da língua). Nem mesmo o Qohelet em toda a sua sagacidade e ironia perversa chega perto do poeta judeu russo.
Katzenelson é um poeta menor se comparado com Bialik. Mas o seu Canto dos Judeus Assassinados deve ser lido, se não pelas circunstâncias assombrosamente heroicas da sua autoria, então que seja pelo registro poético de lamento e crônica de destruição de uma gente.
Ele enterrou esse livro de poesias numa latinha debaixo de uma árvore desse centro de internação em Vittel, para ser achado alguns anos depois da retomada da França pelos Aliados. O poema de número VII (acho) é de gelar alma. É uma canção sobre a deportação de sua mulher e filho na grande deportação de Warsowia a Auchwitz.
não faça isso conosco OI TELECOM!
ResponderExcluirVOLLTA CHARLLES
ResponderExcluirenqto isso... se tiver tempo, charlles, dá uma ouvida num novo som q uns caras daqui, Apanhador Só, fizeram por agora. o disco se chama Antes que tu conte outra. Eu procurei a ordem das músicas e joguei no grooveshark, coisa mais fácil e vale a pena. pelo menos eu gostei.
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