sábado, 11 de agosto de 2012

Culto à Personalidade: Meus 20 Romances Preferidos ( II )


11. Viagem ao Fim da Noite, Louis-Ferdinand Céline

Também um dos romances mais engraçados que já li, apesar de ser uma obra de uma negrura devastadora. Ácido, honesto até a medula, longe de qualquer hipocrisia! Literatura como pouco se vê, daquelas em que o escritor é absolutamente livre para falar o que quer. No Brasil de hoje, obras assim jamais seriam permitidas, ou se o fossem, seria para o assassinato institucionalizado do autor pelas forças partidárias da assepsia social da correção política. No universo medíocre acadêmico nacional, em que os professores populares, ícones de alunos a quem pouco importa as letras mas a titulação acadêmica máxima (daí prolifera-se a praga epidêmica), são oligofrênicos arrogantes acabrestados pelo ideário do partido, Céline seria aceito apenas em sua menção distanciada de "grande autor maldito" em coquetéis honrosos. O tipo de autor que não precisa ler mas fala-se que se lê, para dar uma de descolado. Enfim, aqui tem uma prosa poderosíssima, ousada, feita com sangue. A biografia de Céline é um tanto complicada, como se sabe, mas como é fundamental lê-lo!

12. Em Busca do Tempo Perdido, No Caminho de Swann, Marcel Proust

Demorei para chegar a Proust. Não tem como falar de Proust em poucas palavras. Essas páginas estão entre os momentos mais felizes de minha vida de leitor. Há muito aqui oferecido à alegria do pensamento. Amo Proust.

13. O Teatro de Sabbath, Philip Roth

Há uma resenha longa sobre esse romance nesse blog. Fundamental!

14. Cem Anos de Solidão, Gabriel Garcia Marquez

Romance viciante. Viciei-me nele por uns vinte anos, e foi difícil me desvencilhar da crença de que fosse o maior dos romances, o mais bem escrito, o mais incrível. Daí que fosse natural que eu passasse a odiá-lo por muito tempo, maltratá-lo e desprezá-lo. Mas depois de muito me esquecer dele, pude retornar e ver sua real dimensão. Não sou patriótico e nem ligado a questões geográficas, mas é indiscutível que GGM compôs um imaginário representativo do latino-americano. E aquela primeira frase...

15. O Arco-Íris da Gravidade, Thomas Pynchon

Um aprendizado de estilo de um mestre da escrita. Pynchon é capaz de escrever bem qualquer coisa, de ir além em toda exposição, de atravessar profundidades inimagináveis. E o faz num desprezo às convenções e às boas maneiras de uma maneira provocadora incrível, talvez superando mesmo Joyce. Seu material de trabalho são os objetos de alienação da cultura e do entretenimento de massas: os desenhos animados, as drogas, a televisão, o cinema norte-americano. E nos surpreende com oásis de ternura arrebatadores. É um romance onde tudo acontece_ embora alguns, mesmo eu, em resenha neste blog, digamos o contrário. Há páginas e páginas de histórias alheatórias contadas com um brilho invejável. Realmente um mestre e um gênio, não há meios termos. 

16. Luz em Agosto, William Faulkner

Aqui temos um Faulkner de uma prosa menos intensa, mostrando o quanto o cara era bom na narrativa clássica. É por isso que eu digo que a alta-literatura é o maior dos entretenimentos, e é uma trista mutilação que nosso sistema educacional não esteja na condição de oferecer esse prêmio para os estudantes, mas fique na dama-de-ferro das velhas professoras tristes e pedantes que torturam os alunos com José de Alencar a Daniel Galera. Os personagens aqui violentam o leitor com seus passados, com seus silêncios, com sua incrível solidão, que descamba para a violência desesperada. Li esse romance, sério, mais que cinco vezes, atrás do segredo do por que me fascina e causa sempre um amargo na garganta. Como se nada fosse o que parece. Como se houvesse um impossível desamparo, incorrigível e esotérico, por detrás de todos os crimes. Faulkner era um tremendo de um filho da puta. Vai tomar no cu, Faulkner!

17. Extinção, Thomas Bernhard

Uma pancada do início ao fim. Há uma resenha sobre o autor e a obra por aqui no blog.

18. O Planeta do Sr. Sammler, Saul Bellow

Um romance ensaio, com várias reflexões sobre a condição humana. Também o li tantas vezes que sei longas passagens de memória. 

19. A Consciência de Zeno, Italo Svevo

Svevo foi apadrinhado por ninguém menos que James Joyce, mas não tem nada do experimentalismo joyceano, muito pelo contrário: seu tom é oitocentista e clássico, e sua erudição se embrenha lucidamente para um dos mais bem escritos romances. É um deleite ler Zeno. Ri-se tanto com esse livro! Lembro que mal via a hora de sair do expediente e retornar à casa para reaver o livro em mãos.

20. O Finado Matias Pascal, Luigi Pirandello

Muito já se esqueceu desse romance convencional que nada tem das correntes modernistas, tanto é que não achei uma imagem de capa mais bonita que a que aparece aí em cima. Há décadas ele não é reeditado por aqui. Mas como é bom a narrativa do Pascal que é dado como morto pela família cuja esposa o martiriza, ganha uma bolada milionária num jogo, e começa uma vida nova com uma identidade inventada. Maravilha de livro! 

20 comentários:

  1. O título é bom: Culto à Personalidade. Resta a saber se das personalidades dos autores ou a do leitor em causa.

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    1. Uma ironia, claro. Toda lista é um culto à personalidade de quem a faz. Mesmo as de supermercado.

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  2. e a insustentável leveza saiu voando...

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  3. Qual não foi minha surpresa e felicidade imensa ao ver O falecido Mattia Pascal encerrando essa lista incrível!
    Há livros que tendemos a pensar que não vamos conhecer nunca alguém que também o admira...
    Essa lista é o impulso que faltava par que eu leia Herzog!

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    1. Grato, Renato! Matias Pascal é realmente um romance inesquecível. Fiquei muito tempo apaixonado pela Adriana.

      Não se arrependerá de Herzog.

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    2. Consegui comprar Herzog na semana passada e acabei de lê-lo há alguns minutos, e que alma dilacerada e adorável é esse Herzog!

      Já está na minha lista de releituras.

      Da sua lista, eu só li nove livros (incluindo agora o Herzog). Chegarei nos vinte, e os próximos serão A Consciência de Zeno e Luz em Agosto, os dois provavelmente embaladinhos na aconchegante caixa da Livraria Cultura, em algum caminhão por aí.

      obrigado Charlles!

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    3. Excelente companhia e muitas horas de felicidade pela frente, Renato!

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  4. Pô, O arco íris da gravidade, hem? não sabem de alguém que queira vendê-lo?

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    1. Infelizmente, Ricardo, é muito raro. O último que tive informação pela Estante Virtual custava 150 reais. É torcer para que a cia lance uma nova edição.

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  5. Esgotadíssimo, infelizmente. Cara, que vício! Li o Leilão do lote 49 e não consigo mais parar (após me defrontar com uma resenha sua)... Por isso, fiz uma loucura hoje: encomendei a edição de Portugal.

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    1. Você me fez pesquisar sobre essa tradução para Portugal. Parece que é uma tradução recente;vi um post em que um leitor português lamenta querer ler o livro e no país ainda não dispor de uma tradução. Mas deve ser muito interessante Pynchon em português da terrinha. Nem quero imaginar o valor que você terá de desembolsar. Meu conselho é que trate de comprar o Contra o Dia e o Vício Inerente, antes que eles também se esgotem.

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  6. Apostei minhas fichas na edição portuguesa porque gosto (muito) do português à moda dos patrícios, e, principalmente, pela falta de perspectiva de que ele apareça no mercado local. Sou leitor assíduo das crônicas de António Lobo Antunes, então acredito que não estranharei muito. Estou curioso. Árvores abatidas, lá, chama-se Derrubar árvores, outro que por aqui está o olho da cara, e que falta na minha coleção de Bernhard. O preço do frete é que faz o bebê chorar. E esperar. Deve demorar uns 60 dias. O total saiu, arredondando, por 150,00. Contra o dia e Vício Inerente arrematei no site da Casas Bahia (lá mesmo!); saiu mais em conta que no estante virtual e no livronauta (frete de graça).

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    1. Thomas Pynchon nas Casas Bahia. Talvez se possa dizer que isso é mesmo a cara de Pynchon. Tenho quase tudo do Bernhard lançado aqui, mas me faltam o Árvores Abatidas e o Sobrinho de Wittgenstein, que são mesmo impossíveis de se encontrar.

      150 reais! Não saiu caro não, visto as contingências. O novo da cia das letras, se houvesse, não seria menos que 100 reais. O duro é essa demora. Eu sou um sujeito bem chato nesse ponto, deixei de comprar na Estante Virtual por um tempo por causa da demora de alguns livreiros. Nisso a Livraria Cultura é ótima: a maior parte dos livros que eu compro lá me chega em 4 dias. Exceção feita do último que comprei lá, o Aventuras de Kavalier & Clay, do Michael Chabon. Tá bom, não quero te insinuar para novas aventuras econômicas, mas, pelo visto, temos um gosto de leitura bastante parecido (fico emocionado quando vejo alguém falar de Bernhard), então, quando tiver um tempo, de uma olhada em Chabon, caso ainda não o conheça. Dessas últimas décadas, é o autor mais sensacional surgido nos EUA.

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    2. Esse do Chabon demorou dois meses. Tenho a impressão de que ele estava esgotado também, mas como sou um cliente assíduo da LC, e eles falharam uma vez comigo (fiquei três meses esperando um cd do Miles Davis, que eles me disseram, constrangidos, que estava esgotado), eles fizeram o impossível para consegui-lo. É a impressão que deu, apesar de ser algo improvável. Mas eles mandavam e-mails para mim, durante o processo, estendendo mais o prazo da entrega, alegando que estavam procurando no estoque da editora. E o livro chegou todo embaladinho em celofane, e achei no meio um tique com meu nome onde estava escrito "Entrega especial". :-)

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    3. Chabon? Pois é, já tinha visto uma indicação sua em algum comentário blog afora...mãs (diz o gaúcho), optei por outra indicação: Saul Bellow. O legado de H. tem sido uma das minhas leituras mais prazerosas dos últimos tempos. Essa edição comprei na versão e-book, o que afasta traumas com entregas frustradas ou ineficientes. Nas próximas aquisições, incluirei Chabon.

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  7. Respostas
    1. Esse ainda não li, Ricardo. As aventuras de Kavalier & Clay é maravilhoso. E me deslumbrei muito com o Associação Judaica de Polícia, que é magistralmente bem escrito. Tem uma resenha deste último aqui, no link com o nome do Chabon aí ao lado.

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  8. Bom, os garotos incríveis enreda escritores e isso me excita hehehehe, além do preço que está convidativo no EV.

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  9. Rapaz, e não é que já chegou o Thomas Pynchon à portuguesa...

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