segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Van Gogh


A biografia de Van Gogh lançada pela Cia das Letras, escrita por Steven Naifeh e Gregory White Smith, é um regalo em todos os sentidos. Tem capa dura, e a reprodução em cores (claro!, seria um pecado com Van Gogh se fosse em preto e branco) da obra desse brilhante artista. Tem também as reproduções em preto e branco dos rascunhos do pintor neerlandês, no corpo do texto, além de muitas fotos de época. Chegou-me quinta-feira última e o volume é desses que se fica pegando da estante e folheando, enamorado, a todo instante. A crítica mundial ressalta ser uma biografia ímpar, em alcance e excelência, sendo inclusive revolucionária ao propor, após 10 anos de investigação pelos autores, que Van Gogh não suicidara. Felizmente, nenhuma das resenhas que li oferece spoilers sobre a causa de sua morte, ficando reservado a descoberta para quem queira ler as mais de 1000 páginas do livro. Vou me lançar na leitura a partir do feriado do natal.

20 comentários:

  1. Mais um presente da Cia das Letras?
    Tô com um calhamaço do William C Carter, uma das biografias "definitivas" do Proust para ler também. Tenho que parar de ser frívolo e deixar essas leituras de prazer em suspenso...
    Às vezes a relação com a leitura está mais na ordem da opressão que a do libido...

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    1. Ah, eu li uma outra do Prosut, de George D. Painter. Me pareceu tão boa que acho difícil que este de William C Carter a supere; muitos documentos originais, rascunhos d'A busca do tempo perdido, cartas, depoimentos, trechos autobiográficos, compromissos sociais, coisa demais até para um cara que ficou boa parte da vida recluso em um ambiente inóspito servido apenas de uma camareira. E tome correspondências entre personagens do livro e figuras reais, experiências de Proust recombinadas em passagens do livro, discussões estéticas acerca da obra de Ruskin e outros. Livro interessantíssimo.

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    2. Marcos,

      O "definitivo" fica por conta da contracapa da biografia, que, se não pelas 950 páginas, impressiona pelo extenso arquivo de fotos. Há uma inclusive que impressiona. Nunca a tinha visto nos arquivos de imagens do google. Proust, sem o pitoresco bigode, fartamente barbado, de cara esquálida, deitado placidamente sobre o caixão.
      Grato pela referência a G. D. Painter. Os rascunhos do La Recherche me interessam muito. Há inclusive edições de luxo do La Recherche acompanhadas dos rascunhos, não?

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    3. Sim, Luiz. Pedi esse pois sempre me interessei pelo pintor. Engraçado que no índice remissivo não consta a palavra "daltonismo" nem nada referido a essa anomalia, como assegurou o Milton Ribeiro. Mas havemos de ver.

      Proust é realmente um escritor que oferece um imã para a obsessão. Li nos diários da Sontag uma reflexão interessante (o link está no post anterior), em que ela diz que Proust não sabia que estava escrevendo o maior romance de todos os tempos, e nem o público da época suspeitou isso (já que desconsideraram a obra). Realmente, cada vez que penso neste romance, fico cogitado a aceirar intimamente a possibilidade de ser o maior de todos, em qualquer linha temporal. Li-o num estado de lisergia concentrada (Oliver Sacks disse que devorou um livro sobre enxaqueca de 600 páginas em uma noite, sob o efeito da mescalina, e a viagem minha pelo livro do Swann foi equivalente [recordo que uma vez, num encontro entre minha esposa e eu e um casal de amigos, cada casal levou uma garrafa de vinho do Porto, mas fizeram a armadilha inconsciente de beberem meio cálice e deixarem que eu tomasse as duas garrafas praticamente sozinho_ foi o estado mais próximo ao peiote dos experimentos de Huxley em Portas de Percepção; a leitura de Swann exerceu a mesma reação em mim, e me lembro maravilhadamente de tudo do livro]).

      Não vejo por que a diferenciação da sua parte entre leitura de obrigação e leitura de prazer. Segundo apreendi de seus trabalhos acadêmicos aí, e sua empolgação, eu mesmo teria muito prazer com esses livros que você lê.

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  2. Sem querer te chatear, mas já te chateando, relatos sobre a morte de Van Gogh, segundo a hipótese formulada neste livro, já foram massivamente difundidas em cadernos literários impressos e virtuais. Não acho que "saber as circunstâncias da morte", neste caso, tiraria qualquer interesse do livro, que é uma biografia e não um romance policial. Mais que a tese acerca dessas circunstâncias, o que realmente deve interessar são as circunstâncias de produção do artista, em suas idiossincrasias (com o alcoolismo a contribuir em muito para certo grau de insanidade ou tendência ao delírio do artista) e em seu meio artístico e social, ambos muito importantes na construção do "discurso" plástico de Van Gogh. De fato, tratar-se-ia de uma biografia definitiva, se as controvérsias acerca de qualquer vida não fossem eternas, ou ao menos tão indefinitivas quanto é a própria duração da espécie humana.

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  3. ILHA DAS ÁGUIAS
    by Ramiro Conceição


    Cantam cantos antigos
    que o mal é ardiloso
    e que, sedutor, ilude a plateia
    que, por ter os caninos escuros
    com sangue de assassinatos cometidos,
    não percebe - por medo - a insensatez.

    Cantam sonhos longínquos
    que o mal é a raiz da culpa
    que impede esta monada,
    desde a tenra idade,
    à iluminação, à humanidade,
    ao cuidado desta Terra única.

    Cantam que tudo em nós é fruto
    duma moral hipócrita e repressora
    e que tudo sempre termina
    num medíocre e terrível engano
    colossal de templos e religiões:
    uma manada de anões primatas,
    bambos, prontos pra assassinar
    quem ouse à alegria de duvidar.

    Cantam cantos modernos
    que a nossa civilização
    judaico-cristã-muçulmana,
    por ser estupidamente desumana,
    possui a face dum quadro de Picasso:
    o lado esquerdo em cisalhamento ao direito
    tal qual o desespero em gritos dos ciprestes
    destorcidos das telas de Van Gogh.

    Cabe aqui uma pergunta.
    Fomos, somos e seremos somente
    caretas, caricaturas e canalhas
    dum bando de micos amestrados?

    Cabe aqui uma resposta.
    Por herança da evolução,
    somos um milagre repleto
    de coragem.
    Mas coragem pra quê?
    Para cantar e permitir
    a continuidade da vida
    nesta casa bendita.

    Portanto canto e declaro
    claramente que somos parte
    das consciências do futuro,
    do passado e do presente
    em processos de passagem;
    canto e declaro
    claramente que a diferença
    entre um bem-te-vi e Einstein
    é simplesmente a maneira
    diferente do bater de asas.

    O amor é o senhor da Terra.
    E não há diferença qualquer
    entre a mulher, que nos braços
    seus filhos queridos abraça,
    e o Sol, que com nove braços
    seus filhos queridos entrelaça
    (Plutão não é um bastardo).

    Dizem que sou de aquário
    pois ao sonhar às vezes rio,
    a crer que do nosso aguadeiro
    florescerá a sinfonia do amor
    que será cantada e amada
    em estelares línguas claras.

    Porém, confesso: sou um contumaz
    devorador de astrólogos à milanesa
    regados - é claro - à muita cerveja.
    Contudo, lúcido, continuo a declarar
    que o amor não necessita de templos
    e que nunca será de pouquíssimos,
    pois Beethoven canta - no Uirapuru.

    À frente
    das minhas asas,
    dança com graça
    a Ilha das Águias.
    Lá,
    elas procriam.
    De lá,
    elas vigiam.
    De lá,
    vêm
    o início
    e o fim.

    Eu vim de lá
    pra profetizar, instaurar e mediar
    toda a forma de amar que está ali,
    na estelar sala de estar e, aí,
    dentro do teu amor, caro Leitor.

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  4. Quem se interessar, verdadeiramente!, pela arte de Van Gogh deve amar a sua pintura(mesmo que numa simplória cópia) e ler e reler, e reler as "Cartas a Theo". Só assim comprenderá uma ínfima parte da revelação da Arte: o resto, minhas senhoras e meus senhores, são apenas peidos dos fantoches da plateia da história. Van Gogh é a revelação do sagrado diante desse desgraçado, dito, mundinho.

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    1. Hahahahahaha. Estava sentindo sua falta por aqui, Ramiro. Sinceramente!

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  5. Amigo Charlles,

    Passo aqui para me despedir ao final de mais este ano, que finalmente acabou, o que não deve significar muita coisa, com as promessas que tenho para Janeiro. Aborrecimentos só acabam com a vida, todo mundo sabe. Vejo que o Marcos escreveu uma mensagem aqui e não trouxe um poema que ele escreveu há muito tempo, inspirado em um quadro de Van Gogh, "Os comedores de batatas". Uma pena, eu gosto dele. Publiquei hoje nossas despedidas, aliás, com outro poema dele também, que não deverá voçltar aqui antes do ano que vem - estava louco para deixar de usar computadores. Bons feriados, para você, familiares e demais leitores.

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    1. PLANTADOR DE BATATAS
      by Ramiro Conceição
      .
      .
      O ato de criação é plantar batatas
      porém ensinando aos pequeninos
      a alegria da batatinha quando nasce
      e a dor - d’Os Comedores de Batatas.
      Por isso o poeta deve cavar e colher o óbvio
      que plantou e, qual Dante com o seu Mentor,
      deve ir até o inferno em busca da luz porque
      é no interior do ser que rebenta o esplendor.

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    2. Charlles,
      uma perguntinha que não quer calar: nesse final de ano, o peru vai ou fica?

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    3. Rachel, aguardo o retorno do blog ano que vem. Deixei um recado lá no seu blog.

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    4. Você sempre confundiu essa história do pero achando que o peru era meu, Ramiro. Eu não crio o peru, é o meu vizinho quem cria. Infelizmente, faz meses que eu não vejo o Archimboldo (o peru).

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    5. Quer dizer que você andou a cuidar do peru do vizinho? É, as coisas são confusas, muito confusas... (Cala-te boquinha!).

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    6. Olha, a Rachel falou comigo e me senti obrigado; de quebra, ainda dei de cara com o poema do Ramiro sobre o mesmo quadro, e fiquei sem saber se ele escreveu antes d'hoje ou hoje mesmo, mas ficarei sem saber porque, tão logo postar o meu poeminha aqui, desligarei essa joça e adeus, só em janeiro, e foda-se a profecia Maia. Lá vai:

      Longe do McDonald’s

      Depois da imagem sombria, cinza, cobre
      Ocre, de um azul escuro, de uma luz triste
      Fui às favas, nunca mais
      Às batatas.

      O holandês não era bom poeta; na época
      Apenas um obscuro pintor
      Investido no desejo de sofrer
      Comum a todos fundamentalistas

      Mas por causa daqueles olhos inchados
      Do vapor pestilento de tubérculos descorados
      Fiz da gastronomia minha divisa
      Do tempero minha munição
      E do vinho o sangue deste
      Único general de si mesmo

      Passo ao largo das lanchonetes, no temor
      De encontrar, em alguma delas
      O fantasma do holandês
      Vestido com a tétrica
      Fantasia de palhaço

      Na multicolorida festa de uma feira
      Exploro os cheiros de uma manhã
      Alegre; nas ruas, a fome das pessoas
      Ganha uma expressão luminosa

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  6. ñ passo ainda pra me despedir, q voltarei. estive um tempo fora, estava finalizando meu trabalho de conclusao, q apresentei ontem (fui aprovado!).
    mas, desculpe por postar isso:
    http://www.youtube.com/watch?v=qaW9GzNts-A

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    1. arbo, meu velho, que excelente notícia. Parabéns!

      Vou lá ver o link, que coisa deixada por você aqui sempre é indispensável.

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    2. fiquei até com vergonha agora, "indispensável". hauhauha não é não; coisa de amigo ver uma coisa dessas, esdrúxula, e compartilhar, pelo "susto" da coisa. é absurdo, mas não indispensável.

      em breve te mando algo indispensável.

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    3. arbo, correndo o risco de ser um plágio nelsonrodrigueano: mas o trivial não é indispensável?

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  7. Ah, mas este eu quero ler! Tenho a opção de comprá-lo em formato ebook, através do Kobo, mas não o farei, naturalmente. Seria um pecado. Vou logo providenciar o meu pedido.

    Em tempo: aos amantes de livros, não tenham medo dos e-readers. Eles serão grandes auxiliares escolares, mas o papel ainda tem longa vida.

    Charlles, eu li "Mecanismos internos - ensaios sobre a literatura" no Kobo. Num piscar de olhos. Fiz questão de fichamento. Mas, para ficção, não serve. Em absoluto. Se um dia faltar papel, o homem terá de inventar algo de semelhante. Eu conheço essa emoção de segurar um livro, enamorado, à espera deliciosa (porque sabemos de antemão do prazer que experimentaremos) da hora de lê-lo.

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