Essa não é uma resenha séria, mas anotações para uma. Liberdade tem me deixado com um sorrisinho constrangido enquanto vou avançando para as páginas finais. Antônio Xerxenesky, em seu blog, disse algo perigoso para se dizer sobre um escritor, de que Franzen mais ou menos assim é alguém tão desprovido de uma aparência ameaçadora, tão terninho-de-professor-universitário e cara de bom moço, que isso acaba contando em desfavor na qualidade da sua prosa. E... desconsiderando as evidências em contrário oferecidas por inúmeros outros escritores de ótima qualidade com a inconspícua aparência de vizinho nerd, Xerxenesky acertou em cheio.
Ouso afirmar e provo, que cada página do tão aclamado Liberdade está contaminada de alto a baixo com o bom mocismo de Franzen. Não há uma cena, nessas 300 páginas iniciais, que seja convincente; aliás, não há uma cena nessas 300 páginas que seja relevante. A história da decadência (???? Onde????) da família Berglund é tão isenta de drama, tão limpa de sombras de tragédias, que os diálogos entre os personagens não são mais que isso: diálogos. Por exemplo, quando o garoto Joey vai passar um feriado na casa do pai judeu multimilionário de um colega de universidade, Franzen aborta um sem número de situações que poderiam engendrar grandes cenas de conflitos clássicos entre o extremamente rico e o jovem planejador incipiente, entre o filho castrado pelo fardo do exemplo de sucesso do pai e o macho caçador cheio de certezas sobre a plenipotência do dinheiro; todas essas situações _ que o leitor muda de posição na poltrona esperando que enfim chegou-se ao ponto em que a coisa vai esquentar_ parecem ter sido cirurgicamente removidas pelo bisturi de bom mocismo de Franzen. Há uma cena em que o milionário desce ao porão onde estão os garotos, e inicia-se um jogo de mesa entre os três, em que o velho empresário vai testando o judaísmo recém descoberto de Joey, mas tudo sem gosto, num monocordismo que remete à impressão de que para o autor bastava a prosa supostamente elegante que, justamente aclamada em As Correções, em Liberdade já foi contaminada pela insuficiência de ambições dramáticas de Franzen.
Franzen evita qualquer sinal de trauma em seu novo romance. E, isso feito, torna transparente as outras limitações que ficariam escondidas se um pouco de hormônio fosse instilado na vida restringida à celulose dos personagens. As cenas de sexo, por exemplo, são tão ingênuas, que não seria de se espantar que o alter-ego assumido do autor fosse o diligente e cordial Walter, pai de Joey. Quando a esposa de Walter o trai com seu melhor amigo, o roqueiro Richard Katz, no chalé do casal, o sexo se restringe a parágrafos curtos e quebras bruscas que atenuariam a falta de traquejo de Franzen, coisa que o leitor bem disposto aceitaria, mas o desenlace é colocado no final de um diálogo entre os amantes que repete a forma sem perigo dos diálogos de Franzen. E Franzen erra ao insistir na modística literária do sexo (afinal é herdeiro de Philip Roth e Norman Mailer) nas aborrecidíssimas descrições das masturbações de Joey, coisa que ocupa umas 50 páginas em que a história cai num ralo circular de descrever os "dramas" e "sofrimentos" nada mais que peculiares da adolescência de Joey. E as descrições de sexo entre Joey e Conny são de dar bocejos.
Pode ser que a última metade do livro confirme a impropriedade da crítica antes de terminada a leitura. Mas por enquanto, Liberdade está me servindo a dar mais valor retrospectivo a 2666, e a ver o quanto a imprensa literária dos EUA regrediu a uma bajulação que inventa atributos de grandeza baseados num parco conhecimento do que é boa literatura.
Já li o novo Franzen e, apesar de ter gostado do livro, entendo algumas de suas críticas. Mas é claro que é uma história de decadência familiar, é claro que há drama. A família Berglund é um erro como se percebe pelas histórias pessoais da Patty e do Walter – como se conhecem, a relação de ambos com o Richard, etc. Não é preciso uma tragédia monumental para que a história seja boa, mas de fato o Franzen tratou tudo de um modo meio light – light é exagero, mas não me vem outra expressão – para aquilo que se espera de “o grande romancista americano” como definiu a Time.
ResponderExcluirAchei Liberdade um livro inferior a Correções para começar. Correções mesmo não foi o livro da década passada como elegeu a Time (ou outra revista importante qualquer…ms acho q foi a Time), e é negável que há uma histeria pouco compreensível em torno do Jonathan Franzen para quem tem o costume de ler umas coisas. Não é que ele não seja bom, ele é, e até aceito que se faça essa publicidade toda, só que então o que se faz com livros de outros escritores até ver bem melhores do que ele? Essa espécie de endeusamento do Franzen é sem sombra de dúvidas sem sentido.
Correções tinha personagens mais interessantes, e o livro todo fluía bem melhor. A escrita Franziana é boa não sendo nenhum fenómeno. Gosto de alguma tiradas dele mas outras são bem banais. Em Correções por exemplo, ao usar uma linguagem que se aproximasse ao estado mental dos personagens havia muitos exageros no modo como por exemplo o Lambert que fazia qualquer coisa lá no meio empresarial ou financeiro processava coisas como o amor com uma linguagem financeira que, se proporcionava momentos muito interessantes, noutras o Franzen exagerava em passagens de estraçalhar o bom gosto.
Franzen é um escritor que gosta de tentar passar o chamado zeitgeist, a incorporação do espírito de um tempo. Mas ele tem sempre muitas imperfeições que nos impossibilita de dizer uma barbaridade como a de que ele é o grande romancista americano (como disse a Time) quando Philp Roth, Pynchon, McCarthy, DeLillo entre outros, estão vivos. Sequer o Franzen é até momento o melhor da sua geração, o melhor é mesmo o seu já falecido amigo David Foster Wallace.
O livros do Franzen são sempre de exploração intensa de um grupo de personagens. E os de Liberdade não chegam a ser tão interessantes quanto isso. Achei que a história do Walter e da Patty teve momentos muito bem conseguidos mas ficou sempre faltando qualquer coisa. A história do filho deles é de doer de tão banal, de fato. Tendo em conta o esquema dos livros do Franzen fiquei sem entender a falta de exploração do personagem da filha deles.
E conhecendo as intenções do J. Franzen o livro se revela totalmente previsível. Quando acontece por exemplo aquela situação com o vídeo que faz sucesso na internet não tem como não ficar ligeiramente impaciente. Era óbvio: para um escritor como Franzen retratar o tempo em que se vive é essencial e a internet tinha que estar ali. E apareceu sem surpresa, sem interesse, como uma peça que entrou forçadamente porque tinha de estar. Isso torna as coisas plástica, esquemáticas e sem o fulgor da grande literatura.
Franzen me aborrece sobretudo porque parece sempre que vai ser melhor do que é de fato. Um exemplo foi a parte que você referiu, a do filho dos Berglund na casa do garoto descendente de judeus, certas coisas pairam no ar e acabam não sendo exploradas.
Franzen me agrada pelas suas intenções – a de um regresso a um romance puro num tempo de excessos experimentalistas que muitas vezes são vazios. O bom e velho romance não morreu não, e isso Franzen prova, que pode haver um retrocesso. A exploração dos personagens ao limite proporciona uma experiência de leitura cheia de densidade emocional e psicológica que torna os personagens mais “reais” ao leitor, como se estivéssemos dentro de uma história verdadeira. Mas Franzen não é ainda, de fato, um escritor essencial, digamos assim. Nem perto. E um leitor mais atento fica logo desconfiado dessa publicidade histérica e exagerada que vem lados states.
Ups!! Dei um novo olhada no seu post e lembrei que voce não tinha terminado o livro.
ResponderExcluirMELHOR NÃO LER O MEU COMENTÁRIO mesmo, não sei em que parte vai e pode ter spoilers pélo meu comentário...
Nada mais irritante do que isso...
RA
Não, RA, não há spoilers aí. Na verdade falta menos de 50 páginas para meu término da leitura. Compactuo com tudo o que você disse. Mas uma justiça deve ser feita a franzen: sua intenção, desde o excepcional As Correções (esse sim julguei um romance maior, ainda que num patamar abaixo dos de Roth, etc_ não vamos falar aqui de Bellow, pois seria covardia) parece não ser o drama e nem a tragédia, pois, deve se lembrar que naquele romance as coisas acabam bem para todo mundo, num final feliz que soa mais a um escritor vitoriano menor do que à densidade shakespereana dos grandes romances de Roth (nada que franzen escreveu se sustentaria em pé diante, por exemplo, O Teatro de Sabbath). O patriarca de As Correções é naufragado num acidente banal num navio, e páginas seguintes aparece ileso; o intelectual fracassado que vai para a Romênia sofre experiências de menor envergadura do que, por exemplo, o deão de faculdade em December´s Dean, de Bellow, em sua viagem a uma nação socialista. Falta a Franzen o sofrimento, a maldade, o ácido, a maledicência. A cena do almoço na casa do milionário, que citei, nas mãos de um demônio como Roth, seria algo monumental, carregada de pecados.
ResponderExcluirA crítica norte-americana sofre um empobrecimento gritante. Dizer que Liberdade é o romance do século é levianíssimo e atende só aos apreciadores de listas de best-sellers. Não sei se você já leu Michael Chabon, principlamente "As Aventuras de Cavalier e Klein", pois dá de dez a qualquer coisa que Franzen tenha escrito.
Caro Charlles, chego com anos de atraso a esta conversa. Permita-me um pequeno comentário.
ExcluirConfesso que li, li com avidez e sofreguidão o "Liberdade". Franzen me seduziu. Ele escreve bem e maneja com talento a técnica de composição de cenas, o esboço de personagens, vai pontuando a trama interessante que promete um desenlace atordoante, sem cair no exibicionismo de virtose mas, pelo contrário, com uma discrição quase flaubertiana.
Foi seu domínio técnico q me prendeu nas primeiras páginas e conseguiu me levar empolgado até o terço final, na vã expectativa de testemunhar uma virada, o momento em que os trens se chocam frontalmente e produzem vítimas fatais, perdas irreparáveis e um grande sentimento de luto - mas qual nada! Toda a história é narrada como se os personagens estivessem se dirigindo para um abismo, mas o autor os faz atravessar uma firmíssima ponte sem que eles sequer vislumbrem sua beirada fatal.
Onde está o grande momento em que o insípido bom menino walter deixaria sua sombra de intelectual intolerante assumir e transformá-lo no tal ogro de Atenas? Fiquei consternado com a mornidão choca do clímax - o homem esperneando ao vivo, numa denúncia histérica da hipocrisia, que ele mesmo alimentou, deixou-me frio.
A rede de corrupção em que Joey se mete é simplesmente desfeita com sua promessa compungida de doar todos os milhões obtidos para uma causa beneficente. Seu relacionamento obssessivo com Connie acaba em casamento! A complexada Patty, outrora desprezada pela família pedante, obrigada a desistir de denunciar um estupro por causa das ligações políticas dos pais com a família do violentador, faz uma reconciliação frouxa e totalmente clichê na beira da cama do pai moribundo. A reconciliação familiar de Patty que antecipa a insípida reconciliação com um walter protetor dos passarinhos.
E, putamadre, o autor faz Lalitha, a única personagem não-branca que parece uma versão feminina do Sexta-feira, morrer num acidente de carro logo depois de insinuar que o projeto antinatalidade (nada convincente desde sua apresentação ao Richard) estava fugindo ao controle dos seus idealizadores.
Realmente, não dá para entender porque fizeram tanto auê sobre esse livro. Deu até preguiça de ler "As correções". Vou me voltar mesmo para "Guerra e paz".
Eu também não entendi nada do que se passou pela cabeça de Franzen, Luiz. Liberdade é um exemplo cabal de como destruir, passo a passo, uma trama interessante. Ninguém mais fala desse livro, o que demonstra o constrangedor hiato da produção do autor. Li um ensaio do Franzen na Piauí, achando que veria ali o poder perdido na ficção, mas ele chega a ser pior ensaísta ainda. Creio eu que se trata do mais dramático exemplo moderno de um escritor que tem muito talento estilístico, mas uma deficiência grotesca de experiências e introspecções relevantes.
ExcluirAh...drama há. Mas nada que se compare a, por exemplo, as narrativas das grandes derrocadas de famílias, como Os Buddenbrooks e as sagas dos Sartoris.
ResponderExcluir"O livro do ano e do século" é um slogn publicitário feito sob medida; ao que parece, esse slogan foi criado por um crítico, ou resenhista, literário. Não é de espantar, uma vez que a imprensa trabalha para servir ao mercado enquanto dele se serve (não importa o preço dos jornais, mas o custo dos anúncios, são eles que pagam as edições). A literatura vista assim, como mercado, será sempre mais um nicho de consumo; para ele, são necessários novos produtos. Todo ano recebemos lançamentos desse gênero: "Surpreendente!", "Poderoso!", "Uma revelação!"; depois, frustração, uma após outra. Não compraríamos (é o verbo mais correto a ser aplicado a uma obra como essa) o romance depois de tudo o que lemos sobre ele no Brasil; agora, então...
ResponderExcluirRachel, o fato é que sou muito ligado na literatura norte-americana, que, a meu ver, foi uma das mais representativas do século passado. Como eu escrevi em algum post passado, essa mídia, mesmo exorbitada e superlativa, que se faz quanto a lançamentos literários, tem mais de positivo do que de negativo. Não esqueçamos que foi a imprensa literária dos EUA que contribuiu substancialmente para tornar Bolaño o novo astro das letras.
ResponderExcluirNão recomendo o Liberdade, ainda mais sabendo um pouco dos gostos seu e do Marcos.
Ah, mais uma vez o "não li e não gostei" funcionou! E eu que pensava que, por implicância, você iria elogiar, mesmo à fórceps, o livrinho desse Frenzy aí. Não é só pela cara de babaca original dele, mas também pelas babaquices pouco originais que disse nas trocentas entrevistas que deu para vender o livreco, dava pra sentir no ar o cheiro da merda que era, ou melhor, é.
ResponderExcluirBem, vamos trabalhar!
Exatamente, concordo com você. As intenções são ótimas, mas não é a mais alta literatura de fato. E o que me aborrece é justamente esse título de grande escritor americano. Philip Roth está vivo, Thomas Pynchon ao que consta também (apesar de que ninguém pode ver ele e de alguns acharem que ele é um mito), e ainda tem Cormac McCarthy, DeLillo e sei lá mais quem.
ResponderExcluirAliás, com essa lista de escritores vivos já era altura de dar um prêmio nobel a um deles. Mas essas premiações do Nobel são muito estranhas, ao que parece eles não gostam de atribuir o prêmio a escritores de um mesmo país seguidamente (atualmente, porque há umas décadas não era assim) e gostam de variar pelo globo. Os melhores devem ser premiados e ponto final, essa coisa de variar por países e cultura já é logo meio injusta… Gostei de Hertha Muller, do Orhan Pamuk, mas não premiaria nenhum deles sem antes atribuir um nobel a um Roth ou Pynchon, até mesmo ao Cormac McCatrhy. Todo mundo festejou o Vargas Llosa e esse já deveria ter recebido o Nobel há um bom tempo na minha modesta opinião.
Nunca li Michael Chabon. Está na minha interminável lista de leituras, precisamente o livro que você citou, mas eu acabo sempre ultrapassando ele por outras coisas, como clássicos que ainda não li, livros de literaturas que ainda não conheço, etc. Já estava até caindo lá no fundo da lista há muito tempo, em posição de acabar nunca sendo lido, mas agora puxei um pouco para cima de novo. Depois de as aventuras de Huckleberry Finn e das de Augie March pelo menos o título é um bom agouro. Quanto a escritores americanos mais recentes conheço melhor o Franzen mesmo, o Safran Foer, o Junot Diaz, o Dave Eggers e, claro, claro o Foster Wallace (que, aliás, percebo que não consigo parar de referir). Falo de literatura recente, anos 90 para cá, porque o Franzen já tem uns 50 anos e o F. Wallace já morreu.
Os Buddenbrooks será mesmo a grande inspiração do Franzen, lembro de ler que ele fez especialização em Thomas Mann numa universidade alemã, se não estou errado. Não é nem de perto meu livro preferido do T. Mann mas também o prefiro aos livros do Franzen.
Meu Faulkner preferido é Luz em Agosto, mas não existe um porquê, não é uma preferência que tenha a ver com o fato de eu achar que é o melhor feito literário. O primeiro que eu li dele foi O Som e a Fúria, ali pelos 14, 15 anos, e naquele misto de sensações entre o “desconfio que não esteja entendendo bem essa família Compson” e o “que coisa diferente…” acabei me apaixonando, lembro bem aquela sensação de descoberta, até ali para mim só existia o jeito tradicional de escrever um livro. Fluxo de consciência, ausência de linearidade ou diferentes vozes narrativas eram coisas que não pertenciam ao meu mundo até então. Só que o Luz em Agosto me arrebatou mesmo, e aí não tem uma lógica, às vezes pego no livro e desejo nunca ter lido para poder sentir aquela descoberta de 1ª vez.
Já divaguei, escrevi demais… fico por aqui.
Ricardo Assis
Marcos, eu implicar você, mas isso nunca aconteceu!!! Dessa vez você acertou no "não li e não gostei". Livros como esse eu leio numa velocidade incrível, o que facilita.
ResponderExcluirRicardo, tô vendo que você é um conhecedor da coisa. Seu comentário dá uma série de mangas para se desfiar. Pena que logo hoje estou na correria. Parece que o Liberdade requereu estudos não só de Mann, mas de Tolstoi. Só que nisso há outro aspecto da falha de Franzen: quando lemos que a Patty se afundou em Guerra e Paz, o efeito é o de deixarmos o livro de Franzen e recair nos grandes panoramas tolstoianos.
E sobre Faulkner...bom, há muitos textos sobre ele no arquivo aí do blog. Para se falar dele exigiria de mim o que o Maiakovski escreveu no seu poema sobre Lenin: retirar o chapéu e se colocar em pé, em sinal de reverência.
Dei uma volta no seu blog e gostei muito de alguns dos seus textos. Por exemplo o do Gonçalo M. Tavares.
ResponderExcluirEu gosto do escritor e como estudo agora em Portugal o meu contato com a literatura do país aumentou.
Concordo também com o que você e a Rachel Nunes escreveram sobre o Lobo Antunes. Sou um grande fã dos primeiros livros dele mas os últimos são não só repetitivos como alguns são intragáveis mesmo. Cada vez mais ele parece se distanciar mais do Nobel que tanto queria e que nos anos 90 o Saramago roubou dele. Aliás, me contaram aqui que naquela época o Lobo Antunes andava fazendo muito sucesso na França e tal e que era um dos favoritos ao Nobel. E aí o Saramago recebeu o prêmio. Tem até a história de que um jornalista do NY Times telefonou ao Lobo Antunes (ele e o Saramago se davam muito mal) dando a notícia do Nobel em 1ª mão e pedindo um comentário, e que o Lobo Antunes depois de um momento de silêncio absoluto respondeu que era engano e desligou. Não tem como não pensar: o que será que passou pela cabeça do Lobo Antunes naquele momento de silêncio? E depois do telefonema? Será que incendiou uns livros?
Meus preferidos dele são Os Cus de Judas, Memória de Elefante, A Morte de Carlos Gardel e O Manual do Inquisidores. Dos últimos li com algum prazer o Sôbolos Rios Que Vão e de resto não gostei propriamente de nada.
Lobo Antunes tem o verdadeiro dom da palavra, metáfora deslumbrantes, algumas passagens de livros deles ficam na memória... "vozes... como que anunciam a partida dos aviões, sílabas de algodão que se dissolvem nos ouvidos, à maneira de fios de rebuçado (bala) na concha da língua". Sílabas de algodão que se dissolvem nos ouvidos...gosto disso. A luneta que é o “tubo de inventar planetas”, tinha a “cachoeira dos pulmões”, etc.
Quando você lê ou vê entrevistas do Lobo Antunes ele parece se ter em alta conta mesmo. E é muito obsessivo, os últimos livros dele não são nada de novo, nada de surpreendente e ele continua fazendo sempre a mesma coisa e sempre se achando mais do que talvez seja… uma vez disse que escritores há poucos e que hoje em dia só havia 4 ou 5 e se incluiu neles. Em 4 ou 5 vivos… ele fica de fora né…
Quanto ao Gonçalo M. Tavares eu espero que ele tenha no seu baú alguma surpresa, alguma novidade, porque com tanta publicação em tão pouco tempo ele já vai se repetindo e esperam-se grandes feitos dele não só em Portugal mas já pelo mundo afora onde ele vai sendo premiado, o último o de melhor livro publicado em França no ano passado com Aprender a Rezar na era da técnica. O meu preferido continua sendo Jerusalém, talvez por ter sido o primeiro dos livros mais relevantes dele que li, depois de ter lido dois (O Senhor Calvino e o Senhor Valéry) daquela série criativa de livros que ele chama de O Bairro ou de Os Senhores.
Ricardo Assis
Ricardo, Lobo Antunes é um caso emblemático. Li o Cus de Judas, meu preferido, o Esplendor de Portugal, o Conhecimento do Inferno e algum outro que agora não me lembro. É terrível quando acontece essa ausência de auto-crítica, principalmente em autores consolidados. O escritor tem o compromisso de sempre partir da estaca zero a cada livro, e Antunes segue de uma partida por um caminho equivocado, que não é o mesmo de seus grandes livros. Ele simplesmente deixou de ser um narrador_ que é a função imprescindível de um romancista_ e se tornou um gramático puro e um dadaísta. Mais ou menos se pode traçar um paralelo entre ele e Saramago, em seus apegos a um estilo retrô, só que Saramago foi, no mínimo, mais inteligente, pois em seu barroquismo renitente nunca perdeu a alegria de contar uma boa história. Morro de vontade de ler o Antunes de antigamente, mas a cada lançamento ele se perde mais naqueles parágrafos que parece que seu notebook foi contaminado pelo Cavalo de Tróia. Acho que, infelizmente, Antunes morreu. E essa história que vc contou...lembro de uma história antagônica narrada pelo Saramago, em um de seus Cadernos de Lanzarote, em que, no ano do Nobel em que todos esperavam ser o dele, foi para o Dário Fó. Quase no dia seguinte, Saramago e Pilar recebem um bilhete de Fó, reconhecendo, subliminarmente, que a Academia havia errado, que afinal, o Saramago merecia mais que ele. Um gesto de cavaleirismo.
ResponderExcluirTambém espero o mesmo de Gonçalo, que julgo ter muito o que mostrar, ainda. Mas prefiro o Rezar, a Jerusalém.
Temos muito que falar ainda, Ricardo. Às vezes penso que o Google Analytics tá maluco, pois tem dias que aparece com sete locais diferentes de Portugal com alto número de visualizações.
Agora vou ter que sair para passear com a patota.
Charlles, vou lhe pedir um favor.
ResponderExcluirEstou tentando postar no Milton mas não consigo: nem com o computador de casa e nem com aquele do trabalho. É muito estranho...
Por favor, tente avisar o Milton. Por exemplo, agora, aqui de casa, não consegui nem acessar o blog do dito-cujo.
Será que ele está de mal comigo? Até onde eu saiba, não fiz nada. Por favor, me faça esse favor...
Estou com delirium tremens...
Comigo aconteceu o mesmo, Ramiro. Acho que ele deve estar sofrendo uma crise de ateísmo extremo, não acreditando nem na internet, o que criou esse bloqueio.
ResponderExcluirQuentinha...,
ResponderExcluire tudo a ver com o seu post, Charlles.
ALMA E LAMA
by Ramiro Conceição
Tenho profundo nojo,
uma vontade de matar
quando diante de “gigolôs
das angústias humanas”.
Ah, como é necessário encarar a morte
para se poder viver, sadiamente, a vida.
Ainda bem que o existir é breve,
e o tempo esquece. Ainda bem
que sou poeta a cuidar da chama:
eis meu verso feito de alma e lama.
Charlles,
ResponderExcluirao seu Amor à sua Mulher e aos seus Filhos, à sua busca por sabedoria, ao seu Goiás...
ESTELARES
by Ramiro Conceição
Na planície
agora existe
um perfume:
teu nome…
Por isso,
precisamente,
preciso-de-ti,
pois, quando
te amo, canta
a castanheira
ao bem-te-vi!
Houve antes.
Existe agora.
Haverá depois.
Então, meu amor,
por favor, aviva-te!
Porque o sagrado da Vida
é o tempo que nos habita.
Na rua das castanheiras,
namoro o amor que mora.
Lá, crio, rio, choro
e devoro-te… É,
quando o amor nos beija,
enfeita, Alguém, com véus
as castanheiras… do céu.
O que será de mim
quando o Sol pentear
os teus cabelos
e o amarelo revelar o quê que
nunca vira antes… tão belo?
O que será de mim quando,
porventura, o teu sorriso passear
qual mar que leva um bardo à vela,
grávido, à fundura do amor bendito
qual antílope enamorado a farejar
no orvalho a dádiva do teu perfume?
Ai, de mim! O que farei quando fores
uma perdida esperança… em mim?
Meu amor, quando se der a despedida,
sejamos então, só, as sementes à Vida!
Pois as lágrimas são encontros com as marés
de onde viemos e das quais ressuscitaremos:
estelares!
Belo, Ramiro! Obrigado.
ResponderExcluirO Ramiro comom poeta é uma boa puta: dá pra todo mundo...
ResponderExcluirMarcos,
ResponderExcluirantes ser uma puta da POESIA
à "Liberdade, Liberdade"
de Millôr e Flávio Rangel...
SUBJUNTIVO-INDICATIVO
by Ramiro Conceição
Minha biblioteca não tem livros!
Minha tese… não foi escrita!
Meu dicionário não tem palavras!
Todo santo dia, coloco
a meia direita na orelha
esquerda e a outra, na outra.
São os sapatos
das mãos, não são?
Quando não há confusão:
o esquerdo fica à esquerda,
o direito, creio… à direita.
O problema é que sempre
encontro só um, no escuro.
Toda madrugada, por hábito,
devoro um pedaço da mesa.
Por falar nisso, outra preciso.
Porra, que porre, amanheceu!
Então feito uma borboleta
nadarei por essas praças…
Se alguém me der “Bom dia!”
no subjuntivo:
polidamente, direi “Bom dia!”
no indicativo.
http://revistatrip.uol.com.br/so-no-site/notas/autor-versus-autor.html
ResponderExcluirARBO
Não poderia concordar mais. Ganhei o livro e comecei achando a leitura presunçosa e pretensiosa. Busquei por críticas para ver se estava perdendo meu tempo ou se ela ficaria melhor, e sou grato por ter chegado a este blog. Li também uma entrevista do autor à Folha de S. Paulo que comprovou minha sensação de que era arrogante. Ele se compara a grandes autores, se acha a última cereja do bolo, e é hipster o suficiente para se incomodar com uma indicação da Oprah porque, é claro, ele não queria que seu livro fosse mainstream e lido por donas de casa.
ResponderExcluirEnfim, já desisti da leitura e não o recomendo.
Foi o que achei, Leandro. Se você quiser ler um grande escritor norte-americano atual, que é bom pra valer, invista em Michael Chabon.
ExcluirAbraço.