quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Uma Oração, por Jorge Luis Borges



 Minha boca pronunciou e pronunciará, milhares de vezes e nos dois idiomas que me são íntimos, o pai-nosso, mas só em parte o entendo. Hoje de manhã, dia primeiro de julho de 1969, quero tentar uma oração que seja pessoal, não herdada. Sei que se trata de uma tarefa que exige uma sinceridade mais que humana. É evidente, em primeiro lugar, que me está vedado pedir. Pedir que não anoiteçam meus olhos seria loucura; sei de milhares de pessoas que vêem e que não são particularmente felizes, justas ou sábias. O processo do tempo é uma trama de efeitos e causas, de sorte que pedir qualquer mercê, por ínfima que seja, é pedir que se rompa um elo dessa trama de ferro, é pedir que já se tenha rompido. Ninguém merece tal milagre. Não posso suplicar que meus erros me sejam perdoados; o perdão é um ato alheio e só eu posso salvar-me. O perdão purifica o ofendido, não o ofensor, a quem quase não afeta. A liberdade de meu arbítrio é talvez ilusória, mas posso dar ou sonhar que dou. Posso dar a coragem, que não tenho; possa dar a esperança, que não está em mim; posso ensinar a vontade de aprender o que pouco sei ou entrevejo. Quero ser lembrado menos como poeta que como amigo; que alguém repita uma cadência de Dunbar ou de Frost ou do homem que viu à meia-noite a árvore que sangra, a Cruz, e pense que pela primeira vez a ouviu de meus lábios. O restante não me importa; espero que o esquecimento não demore. Desconhecemos os desígnios do universo, mas sabemos que raciocinar com lucidez e agir com justiça é ajudar esses desígnios, que não nos serão revelados.
        Quero morrer completamente; quero morrer com este meu companheiro, meu corpo.

(Obras Completas, volume II; Elogio da Sombra, p. 416; tradução de Carlos Nejar e Alfredo Jacques; editora Globo)

6 comentários:

  1. Da minha parte, estou feliz por você ter voltado e pronto.

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  2. Obrigado pelo carinho, Caminhante. Acho que fiz igual a você, quando leu o Bauman. Só que, além de uma certa canseira em escrever aqui (normal), sumi por pouco tempo por razões domésticas comuns.

    Há dois dias visitei o blog de uma professora carioca, muito bom, em que ela trata de educação, livros, cinema e cultura em geral. Sempre a leio, mas, havia ficado uma semana sem ir lá. E que sensação ruim quando leio ela dizer que vai fechar o blog. Sua única justificativa foi que o provedor que ela usa havia limitado ao máximo o tamanho dos textos, de forma que a obrigava quase ao formato do twitter. Além da tristeza me veio a incompreensão diante um motivo tão técnico, que para a resolução bastava que ela mudasse pra o blogspot ou outro qualquer (cheguei a deixar essa sugestão na caixa de comentários).

    Me senti meio culpado, tipo como se só eu que lesse seus textos e, meu súbito desaparecimento, a desmotivara. Ela tem doutorado, escreve bem pacas, posta com uma frequencia diária religiosa, mas, nunca entendi, pouquíssimas vezes alguém deixa um comentário. Nesses mais de três anos que existe o blog, conta-se em uma mão a quantidade de comentários. Sei que blog é blog, que a influência dela como professora se faz pela prática na sala de aula, sendo o blog pouco indicador; escreveu livros, etc. Mas fiquei muito penalizado, e odeio ficar penalizado por alguém. É a pior ofensa que se pode ter por uma pessoa. E além do mais, os comentários ás vezes não são mostradores fiéis de quanto um blog está sendo lido (um dos 3 posts mais visitados aqui, para meu espanto, tem só 3 comentários, meu texto sobre o Carver).

    Isso meio que serviu para me desmotivar a escrever aqui, por esse tempo. Pensei em escrever um post sobre isso, uma espécie de metalinguagem. E, também, justo nestas semanas vésperas de natal meu trabalho de veterinário tem aumentado, devido a providências sanitárias no frigorífico por uma incidência de alguns bois com tuberculose.

    Não sei se expliquei alguma coisa nesse paradoxal LOOONGO comentário. O blog vai muito bem, não é isso. Tá tendo mais visitas que esperava. Crise de blogueiro, mais essa agora. Volto depois dos feriados de final de ano.

    Um abração e feliz natal, mesmo não gostando!

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    1. Charlles, qual é este blog? Ela realmente parou de escrever?
      Abraços.

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  3. bá, outro dia tinha te falado do braziu, e agora eles acabaram tbm, como tinham feito com a nova corja... que bosta. nem pense nisso.

    mas tbm, quem sou eu pra pedir isso... hj mesmo, por esse contexto de primeiro de janeiro, estava pensando nisso... se eu tivesse um blog - e minha prudência toda está em ñ ter um - teria escrito algo juvenil como "questiono pq o gram acabou sem eu ter nem me prestado, todavía, a COMECAR" {ñ tem cedilha nesse teclado, estou no paraguay}
    o gram foi uma bandinha tri q teve um vida curta faz um tempinho
    arbo

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  4. Que estás a fazer aí, meu amigo?

    Não penso em acabar, nem a continuar com o blog. Vai no flagor das circunstâncias.

    Vc está longe de ser juvenil, Arbo.

    Agarro-me às boas convenções: feliz ano novo pra você e tudo de bom.

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  5. bons flagores [?] então

    e obrigado

    estava no paraguay pq minha esposa é de lá, tenho ido para as festas, nos últimos 4 anos...
    aportei hj em portoalegre, amanhã tô indo pra praia por uma semana

    abraço!

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