terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Carnaval



Vejo a enorme diferença entre o site da Amazon brasileira e o site da Amazon em língua inglesa. Na inglesa, para cada livro que eu procuro há centenas de opiniões apaixonadas e críticas de leitores; não qualquer livro, mas Pynchon, Faulkner, Philip Roth, etc. Para Gravity's Rainbow, por exemplo, há 421 opiniões de clientes. Mas vamos a um lançamento mais recente, como o último livro do Ian McEwan, The Children Act: 811 opiniões de leitores. Já a Amazon brasileira é um deserto.

Vejo a mesma coisa em referência ao site PQPBach. Uma postagem como esta, antológica e histórica, com minguados 3 comentários. Sei que há centenas e talvez milhares de admiradores fervorosos do PQP, e talvez comentários da maior parte deles soem redundantes. Mas não contenho uma certa impressão de que em outro país com melhores índices culturais (sim, eu acredito que existam "melhores índices culturais" entre países), a exultação seria bem mais evidente.

51 comentários:

  1. Olá, você poderia recomendar livros para uma garota de 15 anos?

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    1. "As meninas" da Lígia Fagundes Telles.

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    2. Walt Whitman! Para começar logo de cara com o que de mais lindo existe, e tornar-se um apaixonado não só pelos livros, mas pela vida.

      As sugestões do Paulo, Conan Doyle e Poe, são ótimas; foram estes dois a minha "iniciação", junto com Julio Verne, e depois dos livrinhos da coleção Vagalume.

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  2. Não discordo, mas há no mínimo um atenuante pro que você diz das Amazons. Enquanto a nossa Amazon é acessada apenas por nós, a de língua inglesa é acessada por gente do mundo inteiro. O que também é um dos motivos para que um livro brasileiro nunca tenha tantos leitores como os escritos em língua inglesa. O novo Hatoum só vai ser lido somente por nós; o novo Franzen será lido por americanos, brasileiros, chineses, o escambau, antes de ser traduzido.

    Por outro lado, não há como negar que, eliminada a diferença internacional, imaginando uma comparação em que só contassem os comentários dos americanos lá, e dos brasileiros aqui, nosso vexame seria maior que aquele inesquecível 7x1.

    (Ah, comecei ontem Todas as Almas, e é o início de romance mais divertido dos que li de Marias).

    Uma garota de 15 anos talvez goste de O Apanhador no Campo de Centeio.

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    1. É o que eu disse: os brasileiros raros que leem, leem mesmo. O tal do Jorge Pontual da Globo News disse que os EUA estão tão maus de leitores quanto o Brasil, o que é uma mentira clara, já que o maior mercado editorial do mundo está nos EUA.

      Isso de livro para uma menina de 15 anos é muito relativo. Por que menina? O anônimo é uma menina? Recomendo o que direciono minha filha ler nessa idade: Kafka, Hannah Arendt (sobretudo Homens em tempos sombrios e Eichman em Jerusalém), Dostoiévski, Tolstói. Penso que os americanos devam ser lidos depois dos russos e europeus, sob o risco de se inverter essa lógica os primeiros soarem um tanto levianos e desespiritualizados. Quero que minha filha leia todos os grandes livros esotéricos, que creio será uma grande riqueza em todos os níveis para ela.

      Eu e a Júlia assistimos Esperando Godot algumas vezes. O interesse foi despertado depois que eu a vi com um de seus olhares distraídos para o nada e lhe perguntei se ela estava esperando Godot. Ela ficou tão curiosa que pediu para ver o livro e sempre quando vai à nossa biblioteca me pede para pegar o "Dodot".

      Uma das iscas para se criar grandes leitores é o mistério, o estranhamento, a adstringência deliciada da não compreensão. Acho um fator perigoso e muito limitante dar livros bastante assimiláveis para crianças e jovens. O sistema educacional do Brasil é todo fundamentado em destruir o gosto pela leitura através de pautar a leitura formativa em puerilidades e facilitações. Por isso nossos pouquíssimos leitores e nossa literatura ser rica em cronistas.

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    2. Fico firme com o Salinger. Todos de 15 anos a quem indiquei O Apanhador adoraram e viraram bons leitores. Inclusive minha irmã, que virou leitora voraz. Senão, indico Histórias Extraordinárias, de Poe, e os contos com Sherlock Holmes, de Conan Doyle.

      Esses dias vi alguma menção a Alasdair Gray, mas nem me lembro o que era.

      De primeira pensei: "Godot para uma criança?", mas depois vi um desenho infantil e me dei conta de que elas se dão muito bem com o absurdo.

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    3. Realmente, Poe e Conan Doyle são muito recomendáveis. É que parecem óbvios para um leitor velho como eu. E os contos de terror do Rudyard Kipling, publicados pela Bertrand e traduzidos pelo J. J. Veiga.

      Prefiro a série Vaga Lume a Salinger. Sem ironia.

      Godot é uma maravilha para todas as idades (da série "frases grandiosas para passar o dia").

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    4. Sim, eu (o anônimo) sou uma menina. Dei minha idade e meu gênero porque eu queria leituras que fossem não tão complexas pra minha idade. Eu li O Apanhador no Campo de Centeio quando tinha 14 anos e amei, tornou-se um dos meus livros favoritos!! Por outro lado li Memórias do Subsolo e entendi quase nada: tive que buscar várias resenhas na internet.
      Um muitíssimo obrigada a todos que me indicaram, vou procurar e ler todos. :D

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    5. Charlles e os confrades do blog temos a obrigação moral de indicar mais livros para a leitora anônima.

      Depois que ler os indicados, recomendo Os Três Mosqueteiros, de Alexandre Dumas, que é o livro mais viciante que já passou por minhas mãos. Detalhe: não pegue uma edição resumida, porque não vale a pena. Cortam demais. Os Três Mosqueteiros de verdade é pra ter mais ou menos umas 600 páginas.

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    6. Mais recomendações:

      Comecei com o Stephen King, culpa do filme O Iluminado, e como o King falava muito de Lovecraft e Poe, parti pra eles. Mas só comecei a amar mesmo literatura quando fui apresentado a dois livros no meu ensino médio, quando eu mesmo tinha quinze anos: O Conto da Ilha Desconhecida, do José Saramago, e Primeiras Estórias, do João Guimarães Rosa.

      Do primeiro: um livrinho magrelinho, é só um continho só, mas na escrita toda liberta do Saramago, com suas próprias regras gramaticais, que eu na época não sabia ser possível; do segundo: pode parecer um pouquinho exagerado recomendar o Rosa pra gente muito jovem (o homem tem uma fama de difícil, mas é menos culpa dele do que de gente mal intencionada), mas eu fui ler o Primeiras Estórias quando tinha quinze anos iguais aos seus e fiquei para sempre encantado.

      Das recomendações do resto do bando, eu não poderia concordar mais com o Fabricio: Walt Whitman! Eu só não conheço uma tradução legal em português. Se o resto do povo conhecer -- a gente fala pouco de versos por aqui, não? Mais um: o Manuel Bandeira tem a obra completa num livrinho chamado Estrela da Vida Inteira, que é um pouquinho complicado de achar por aí, mas que acabei de ver aqui que a Amazon tem (só dois em estoque!) e está vendendo pela metade do preço: http://www.amazon.com.br/Estrela-Vida-Inteira-poesia-Manuel-Bandeira/dp/8520923496/ref=sr_1_1?ie=UTF8&qid=1424441267&sr=8-1&keywords=estrela+da+vida+inteira

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    7. João, eu li o Leaves of Grass nesta edição bilíngue da Iluminuras: http://www.skoob.com.br/livros/folhas-de-relva/274ed377

      Fui passando de uma língua à outra, e de fato, a tradução é bem capenga, cheia de erros esquisitos. Mas o original em inglês está lá, para dar uma força, ou mesmo para ler direto nele. Recomendo ainda esta edição pois ela traz também uma biografia breve mas muito boa do Whitman, no fim do livro.

      Sobre versos, eu poderia fazer a seguinte pergunta: que poetas vocês recomendam para um garoto de 35 anos? [risos]

      Whitman eu conheço e venero há muito tempo, mas só fui me interessar de forma mais geral por poesia coisa de poucos anos atrás. Li aquela poeta polonesa citada pelo Charlles aqui, gostei muito. Peguei também a dica recente do Khayyam. Mas não conheço muito mais do que isso... Além destes, deixa eu ver: Pessoa, Bandeira, Rilke, Wordsworth, Rimbaud e Baudelaire, e acho que é só o que eu li de poesia. Alguma pouca coisa de Auden e Eliot. Além do nosso amigo Ramiro, através do que ele publica por aqui de vez em quando.

      Aliás, estou lendo um livro do Rilke que não é poesia, trata-se de uma espécie de relato sobre sua estadia em Florença. Agorinha pouco mesmo, no descanso pós-almoço, eu li um trecho onde ele descreve um convento cujo pátio interno é feito de caminhos de passeio por entre jardins, e estes estão sempre cheios de padres e religiosos caminhando solitariamente. "Foi a nostalgia que os levou a estas numerosas ramificações; um pequeno símbolo apaziguado do grande vaguear, uma lembrança de tudo aquilo que os caminhos não abarcam mais." Muito bonito isso, não?

      Ainda nas recomendações para nossa jovem amiga: tem o On the Road, mas se ele cheirar muito a clichê, experimente Os Vagabundos do Darma, que eu prefiro ao On the Road. E por falar em clichê: Admirável Mundo Novo e 1984 ainda são válidos hoje em dia, não?

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    8. Whitman é um desses escritores que estão na minha alma. Borges o amava também, e, se não me engano, o conheceu em alemão (ele mesmo faz humor com isso), para depois o ler em inglês. Eu tenho todas as edições de Folhas da relva lançadas no Brasil. Esta a que se refere é a tradução da famosa primeira edição da obra, com menos páginas. Essa tradução é chocantemente fraca, apesar de todo o barulho que se fez e do ensaio honesto do tradutor. O que me deu gosto nela foram as tantas fotos e o estudo sobre a vida do poeta e as circunstâncias em que foi escrito a obra_ e o marca-página charmoso que se destaca da orelha. A melhor tradução de Whitman, muito boa mesmo, foi lançada pela Ediouro, uma compilação chamada Folhas de folhas da relva, na linha do lançamento pela mesma editora de Flores de flores do mal. Vou contar papo e parecer esnobe, mas sei de cor A canção da estrada aberta, de tanto ler e declamar. Em minha época de solteiro eu costumava beber vinho e ler esse poema em voz alta, e eu chorava e me exultava diante tanta beleza. Whitman é um iluminado, um escritor único que, ao contrário da grande maioria, não fez da amargura e da infelicidade seus temas, mas trabalhou com a liberdade extasiante e a impressão religiosa sem dogmas da imortalidade. Foi um desses caras que me salvou a vida. Recomendo muitíssimo essa edição da ediouro, que injustamente não me lembro seu tradutor, mas cujo trabalho é ótimo. Tenho a edição clássica americana de capa verde que parece uma bíblia, além de uma edição pouco cotável de Portugal.

      Sobre outros poetas, amo Salvatore Quasimodo, para mim um dos maiores do século passado, e Juan Ramón Jiménez. Gosto muito do Seamus Heaney, além do Eliot. Há uns três ou quatro poemas de Maiakóvski que tem a ousadia de serem quase tão magníficos quanto os do Whitman. Gosto de um livrinho de poemas singelos e despretensiosos de Herman Hesse (que se ligou em mim com a audição de Little light music do Jethro Tull e a despedida em definitivo de uma antiga namorada), e do Tagore.

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    9. Charlles: amo o Whitman na mesma medida que você. Ele foi, pra mim isso é claro, algum tipo de ápice de nossa espécie. Fiquei agora com vontade de acordar cedo amanhã, pegar minha edição (eu só tenho essa da Iluminuras, toda rabiscada e cheia de marcadores, mas já fiquei namorando aquela edição enorme que tem todos os acréscimos feitos pelo autor ao longo dos anos, capa cor de vinho, se não me engano) e ir relê-lo na praia, vendo o sol nascer por sobre o mar, que foi como eu o li e reli já diversas vezes. Mas amanhã não vai dar, terei que trabalhar. Obrigado pelas dicas de outros poetas! Você citou gente de quem eu nunca sequer ouvi falar. Do Maiakóvski eu tenho um volume velhinho achado em um sebo, mas não li ainda. Aliás, no último disco do Manic Street Preachers (que não é aquele que você andou ouvindo, aquele é de 2013; eles já lançaram outro no ano passado, chamado Futurology, igualmente ótimo), no último disco dos gauleses tem uma música chamada Mayakovsky.

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    10. E Charlles, esqueci de acrescentar que o velho Whitman e vinho é realmente uma combinação inigualável. Quem nunca experimentou, nunca viveu. (Poxa, é sexta fim de tarde, acho que podemos todos ousar umas frasesinhas bombásticas e pretenciosas...)

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    11. Hahaha.

      Ironicamente, a única edição completa de Folhas da relva no Brasil é uma de bolso, publicada pela Martin Fontes. Tem até o poema em prosa, ao estilo antecipado da escrita espontânea de Kerouac, que abre o volume.

      Concordo com tudo sobre Whitman. Li certa vez um texto do Osho (é, auto-ajuda, monge renegado, aquele com relógio de ouro de 50 mil dólares e que colecionava carros de luxo), em que ele compara Whitman a Cristo. (Sei lá por que me vem essas lembranças na cabeça.)

      Há poemas do universo pop que são maravilhosos, também, eternos segregados do reconhecimento acadêmico. Quem descobre a autoria desse aqui?:

      There is unrest in the forest,
      There is trouble with the trees,
      For the maples want more sunlight
      And the oaks ignore their pleas.

      The trouble with the maples,
      (And they're quite convinced the're right)
      They say the oaks are just too lofty
      And they grab up all the light.
      But the oaks can't help their feelings
      If they like the way they're made.
      And they wonder why the maples
      Can't be happy in their shade.

      There is trouble in the forest,
      And the creatures all have fled,
      As the maples scream `Oppression`
      And the oaks, just shake their heads

      So the maples formed a union
      And demanded equal rights.
      "The oaks are just too greedy;
      We will make them give us light."
      Now there's no more oak oppression,
      For they passed a noble law,
      And the trees are all kept equal
      By hatchet, axe, and saw.

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    12. Sempre confundo: é da Martin Claret. Aquela...

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    13. Augie March é um romance completamente whitmaniano, de alto a baixo. Tem tudo de Whitman nele, a mesma atmosfera elétrica e a mesma alegria e amor humanitário, Já leu esse, Fabricio?

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    14. Charlles, a edição enorme do Folhas de Relva a que eu me referia é essa: https://hedra.com.br/livros/folhas-de-relva-edicao-do-leito-de-morte . Não é de bolso, e acho que ela é completa.

      Não li Augie March ainda. Depois de ter lido O Planeta do Sr. Sammler, até já comprei dois ou três outros livros dele, que estão aqui na pilha de próximas leituras, mas este não está entre eles... Vou procurar. Também não achei ainda o Dean's December. Tava até para pegar um Bellow para ler, dias atrás, mas acabei escolhendo esse do Rilke citado acima. E já que estamos nessas intersecções de música e livros, sabia que existe uma banda chamada Augie March? São australianos.

      Desconfiei do que poderia ser esse "poema" por causa da primeira frase... Fui conferir e era exato o que eu pensava! Também tive minha fase Rush, adorava o disco 2112.

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    15. Taí, não sabia dessa. Mas pelo que diz a Folha, a tradução é ruim. E vejo na Folha que o articulista concorda que a única tradução decente é a de Geir Campos, a que citei da Ediouro.

      Peguei a tradução da Martin Claret_ que não faz feio, é até bastante razoável. Ela é integral, tem 584 páginas.

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    16. Eu sou muito fraco pra poesia. Fico sempre relendo os mesmos poetas, ou melhor, os mesmos poemas:
      o Ancient Mariner, de Coleridge,
      The song of Wandering Aengus de Yeats,
      Correspondances de Baudelaire
      A Poison Tree de Blake,
      As I Walked out one Evening de Auden,
      Duas versões de um poeminha da juventude de Eliot, A Song ou A Lyric
      Blackberry-picking de Heaney,
      Esse "II" de Paulo Henriques Britto - http://www.algumapoesia.com.br/poesia/poesianet045.htm
      Esse soneto de Bruno Tolentino:

      Se passei dos cinqüenta e das três da manhã
      queimando maço atrás de maço; se me agarro
      desamparadamente ao último cigarro
      como Adão à serpente; se me tortura a vã
      obsessão da queda, o sabor da maçã,
      e ainda assim insisto em modular meu barro
      e fazer dele a gaita, ou a flauta de outro Pã;
      se largo tudo enfim e abro a janela e escarro
      entre a vaidade, a noite e o carro do vizinho,
      será talvez por isso mesmo: porque creio
      que tudo vai passar, mas o canto sozinho,
      se conseguir abrir a escuridão ao meio,
      há de salvar-me! O canto… Esse meu velho espinho
      sempre me fez sangrar, nunca disse a que veio.

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    17. Não gosto muito do Rush, mas essa letra é finíssima.

      Paulo, poesia para mim é muito circunscrita. Trata-se do gênero literário mais difícil. Pouquíssimas pessoas conseguem ser bom poetas, e uma quantidade ainda menor grandes poetas. Se eu fosse contextualizar, na minha biblioteca tem menos que 1% de livros de poesia. Tenho poetas dos quais não tenho nada de sua obra poética, como o Joseph Bródski (que na verdade é um ensaísta incomparável e só um poeta razoável, mas ele nunca admitiu isso), e teatrólogo do qual só tenho sua obra poética, como o grande poeta Bertolt Brecht.

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    18. O maior dos poetas eu nem discuto: Pessoa.

      Pra mim o grande-grande brasileiro é o João Cabral de Melo Neto, imbatível, seguido de Manoel de Barros e Cecília Meireles.

      (Os três -- os três e qualquer escritor brasileiro tocado pela mídia, mesmo que seja só pro milissegundo de pagação de pau jornalística a cada 50-anos-de-nascimento/morte, centenário-de-nascimento/morte etc. -- sofrem um processo de bundificação, em que a poesia vira pelúcia e é descarrilhada pra auto-ajuda. O que mais sofre com isso é o Manoel de Barros, pela alegria constante dos versos dele; o Guimarães Rosa só não sofre tanto porque absolutamente ninguém lê; o Whitman, se fosse brasileiro, seria logo transformado em um guru pedrobialesco.)

      Não digo Drummond porque acho muito irregular, pego um livro dele e tenho que fazer uma espécie de trabalho de garimpo pra achar algo sensacional. Quando acho, vale a pena. Mas com os três lá de cima é só eu abrir uma página qualquer e estou feito.

      O Brodsky foi uma descoberta recente minha. Estava o Collected Poem in English dele e o New and Collected Poems do Czeslaw Milosz um do lado do outro lá na Letras, postos erradamente na estante de literatura inglesa da Biblioteca José de Alencar. Peguei os dois, e embora não tenha gostado tanto do Milosz -- mas digo isso sem ter lido todas as obras dentro do livro, só duas acho que num fim de semana, e aí devolvi -- quanto do Brodsky. Eu gosto muito, mas muito mesmo do To Urania e do So Forth, dois dos seus últimos. Queria ler os poemas do Brodsky em português; por aqui só achei o Marca-d'água, que é um ensaio poético dele sobre Veneza. Tem um trecho lá em que ele arrebenta com o Ezra Pound, poeta e pessoa; conta inclusive que na casa da amante dele em Veneza, Pound pôs um busto de si próprio logo no salão de entrada.

      Os americanos têm Whitman, têm Wallace Stevens -- são os dois mais amados pelo Harold Bloom quando ele foi escrever o cânone --, mas uma descoberta recente minha foi William Carlos Williams. Um dia eu ainda traduzo aquele homem, um dia. Eu me apaixonei por WCW quase que instantaneamente.

      Estudo literatura africana, e aí vou contando logo: Virgílio de Lemos, gente, que velhinho incrível! Criou heterônimos, como Pessoa, e é um bocado difícil de achar, mas se acharem não se arrependerão. Morreu dois anos atrás, um anônimo.

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    19. Três adições:

      Primeira: Bolaño! Eu tive bastante sorte lendo Bolaño, porque comecei detestando (os contos dele, todos deploráveis, e o Amuleto e o Terceiro Reich) e então bati de frente com o 2666 e engoli cada insulto que tinha feito ao cara, e ainda querendo reler aquela obra prima desde que terminei mas não sei nem o porquê de não ter feito ainda. Pois bem: tô com um pdf duma edição bilíngue dos poemas completos do Bolaño chamada The Unknown University, e estou adorando. Eu realmente não esperava que os versos dele fossem tão bons.

      Segunda: no rock, minha letra favorita é a de Time, do Pink Floyd. Somos submetidos a uma das letras mais pessimistas possíveis, mas no final da música a banda retorna pra música Breathe, e é aí que estão os oito versinhos que me garantem que Time tem a letra mais sensacional do rock.

      Terceira: pô, eu tenho um orgulhinho bobo também: decorei Uma faca só lâmina, do João Cabral, tropeçando aqui e ali na hora de declamar, mas decorei = )

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    20. Quarta: eu fiquei muito curioso de ler o Whitman traduzido. Vou procurar as edições aí, especialmente a da Iluminura que o Fabricio mencionou. Quero ver os escorregões da tradução direitinho...

      (Salvatore Quasimodo, Seamus Heaney. Anotados!)

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    21. Sö avisando que gostei da citação a Bruno Tolentino feita por Paulo. E adiciono mais um poeta: Olavo Bilac.

      Jä citaram Tchekov? E Conrad? Acho que já, né.

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    22. Eu bem modestamente venho me juntar a essa boa turma e recomendar uma escritora mulher. Leia a poeta Silvia Plath. Com parcimônia. Comece com o belíssimo Lady Lazarus.

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    23. Este comentário foi removido pelo autor.

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    24. Muuuuito obrigada!!!!! <33333
      É tão bacana encontrar pessoas assim! O tipo de livro que as pessoas que eu conheço costumam ler não me agradam nem um pouco. :(
      O modo que vocês falam dos autores, dos livros, da poesia, das sensações... enfim, tudo! É admirável.
      Espero encontrar gente assim na Faculdade.
      Vocês são o máximo! Se eu soubesse que iam ser tão gentis não viria anonimamente. Beijão!!!!

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    25. Querida Tristessa. É uma alegria imensa reconhecer em alguém tão nova a vocação para as coisas do espírito. Leia vorazmente tudo o que foi lembrado aí em cima. Pessoa. Conrad. Whitman.
      Leia também os clássicos. É preciso fazer um pouco de ground work para apreciar esses. Eurípides, Homero, Hesíodo. Todo trabalho extra é rapidamente compensado no entanto.
      Sei lá. Pra mim não há nada de novo na literatura depois dos grandes gregos. Homero, Sófocles e Eurípides, principalmente. Nada de novo, com a exceção talvez de um Romano ou outro. A releitura de Phaedra e Medeia em Sêneca. Ovídio.
      Ah, por favor. Tente ler Ovídio daqui a uns três anos.

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  3. Já postei lá pelo Pqpbach mesmo que, se agradecesse como merecem em cada obra que disponibilizam, eles pediriam uma ordem de restrição, com medo de sequestro e o escambau. Já baixei tanta coisa deles desde a adolescência -- aqueles santos são responsáveis por quase todo meu gosto por música -- que só dá pra expressar meus agradecimentos em longos e longos elogios homoeróticos em verso. Depois duns relâmpagos aqui no Rio, meu modem queimou, estou faz uns dias desconectado -- e sem fazer questão de estar conectado também, li o VALIS, que é aquilo tudo mesmo, Charlles, muito agradecido, cara, e finalmente chegou o volume de contos completos do Alasdair Gray aqui em casa, que eu estava aguardando desde novembro -- tirando as vezes que peguei o 3G do meu irmão pra me inscrever nas matérias da faculdade e uns miúdos. Estou usando ele agora e a conexão é muito instável aqui pra baixar o Mahler, vou aguardar uns dias. O Bernstein é o meu regente de Mahler favorito, minha porta de entrada pra música clássica foi justamente ele regendo a nona -- uma das experiências mais assustadoras que já tive com arte, ouvir aquele primeiro movimento que começa calmo, com algo de monstruoso inicialmente só se insinuando, como uma sombra na água, e logo depois pulando pra fora com uma boca enorme.

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    1. Das resenhas da Amazon:

      Geralmente não tiro muito proveito das resenhas mais favoráveis, com cinco estrelas, quatro: em geral são elogiosas e só, valendo somente como estatística este-livro-tem-tantas-estrelinhas. As exceções, quando a gente descobre, são encantadoras: os leitores de Richard Powers, os leitores de William Gaddis, os leitores de Pynchon, que são os mais loucos de todos...

      Mas confesso que eu vou direto nas avaliações de uma só estrela, que costumam ser hilárias. Olha só estas aqui do Absalom, Absalom!: "Faulkner couldn't get to the damn point to save his life." & "I know it's not PC, but Faulkner's books are unreadable. IguessFaulknerfellasleepduringEnglishclass"

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    2. A nona a que se refere com certeza é a Nona.

      VALIS é extraordinário, não é João! A cada dia acordo pensando nesse romance, e não me escapa que essa fixação não pode de todo ser normal. Estou relendo Augie March, e daí vou reler VALIS. VALIS me fez gastar 100 reais em livros espiritualistas que ainda não tenho a coragem necessária para confessar aqui. Bom que tenha gostado.

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    3. Hahaha. Eu também sempre vou nas avaliações de 1 estrela, que são hilárias.

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    4. Emprestei o VALIS para um amigo, e ele achou uma série de sites de filmes que partem das influências apontadas pelo livro. Ele baixou 40 filmes que questionam a realidade, e me passou alguns deles. Ontem assisti "O homem que incomoda", um filme norueguês (se não me engano), que compensa ver.

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    5. Não, não, não: a minha nona é a nona do Mahler! Estou me referindo aos primeiros dez minutos (eu acho que a coisa acontece em menos de dez minutos, posso estar errado, mas de qualquer forma: é no comecinho do primeiro movimento), em que o movimento passa do idílico pro berro de repente.

      Vou procurar por esse filme. VALIS -- e desconfio que todo o P.K. Dick do período em que escreveu aquele livro -- é uma coisa que parece ser feita para o cult, não o adjetivo bobinho cult, mas aquela coisa magnética que leva gente absolutamente comum a dedicar dias montando enciclopédias à la PynchonWiki ou DFWWiki, ou diagramas imensos como o dos personagens do Infinite Jest, etc. Se mais algum filme das listas te chamar atenção, pode dizer!

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    6. Assim que meu amigo me passar o restante dos 40 filmes te digo.

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  4. Mas Charlles além do fator da língua inglesa que alavanca os comentários da amazon americana, tem também o fato da população americana ser maior que a nossa e sem falar na educação deles que é infinitamente superior a nossa.

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  5. Mas nem você comentou nesse post do PQB Bach, Charlles! Rsrs.
    Pois é, não temos por aqui a cultura do comentário, pelo menos não nos sites e blogs que envolvem literatura ou a boa literatura, muito menos música clássica. Se você procurar os comentários de literatura mais popular e de adolescente, vai encontrar bastante.

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    1. Comentários não são obrigações, claro. Acho que esse post aqui vale no lugar de um comentário meu lá; já fiz várias referências ao PQP aqui no blog, e já comentei bastante lá também.

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    2. Isso eu sei. Escrevi PQB, é um "pariu" dito por um engripado.

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  6. comecei a ler de verdade ao 17 anos. com isso sinto uma sensação de atraso que me obriga a passar dias inteiros lendo. não tive leituras de verne, poe, doyle, sallinger, etc. mas comecei com os russos... que foi uma puta sorte.

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  7. Dois artigos muito bons, para quem se interessar:

    http://www.cartacapital.com.br/revista/837/quem-nos-governa-9428.html

    http://www.sul21.com.br/jornal/depois-do-consumismo-o-que-por-george-monbiot/

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  8. Pegando o barco andando e a voltar à pergunta do início… Creio, que uma excelente leitura para uma menina de 15 anos seria “Cartas a um jovem poeta”. Tudo está lá: Deus; amor; vida; morte; política; liberdade; livre-arbítrio; arte; solidão (muita solidão!; mas aquela necessária e criativa!). Li as cartas de Rilke umas 150 vezes!… Houve época que as conhecia de cor… Era muito engraçado: diante de alguma perturbação mental pegava o livro e iniciava uma releitura… Não dava outra: em aproximadamente 10-15 minutos a terminava (o livro tem aproximadamente 110 páginas, se não me engano: é patético, hoje, não sei nem o número exato de páginas…).

    Outra coisa. Para uma adolescente que deseja ser leitora, e não uma compulsiva digitadora de botões, por exemplo, de um Smartphone…; meu conselho a qualquer adolescente seria a compra de um dicionário etimológico… Por que? Porque descobrir o sentido de uma palavra nova é muito, mas muito mais importante do que a mera consulta a um dicionário-padrão. Quer ver?

    Acima escrevi a expressão “de cor”. Pois bem, tal expressão vem de “conhecer de coração”. Ou seja, por ser a língua um ente vivo, “de coração” virou “de cor”. Não é fantástico? Há maior verdade e inocência do que conhecer alguma coisa pelo coração? Aqui, agora, vou dar uma viajada… O substantivo “decoração” por certo deve ter a mesma origem, pois decorar, enfeitar um ambiente, só é possível com o coração… Não é verdade? É por isso que a arquitetura descreve praticamente tudo sobre uma dada cultura que a gerou. Bem…, aqui, entraríamos na estética, na ética, na moral de uma dada civilização; e isso é uma outra longa história…

    Ah, se os meus primeiros professores tivessem me incentivado a comprar um dicionário etimológico… Hoje, certamente, eu seria um poliglota… Se não tivesse talento, ao menos seria um “de coração”…

    Entendeu, querida Anônima?... Um beijo, boas leituras e saudações poéticas!

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    Respostas
    1. A continuar meu papo com a Anônima (de 15 anos…), deixo um texto que foi fruto do meu “etimológico poliglota de coração”…


      PALAVRAS
      by Ramiro Conceição


      A mãe da “Inocência” foi uma castanha palavra latina conhecida por “Innocentia”. O engraçado é que etimologicamente o vestido da inocência é um morfema, um prefixo, “in”, com sentido negativo; sim, inocência quer dizer o contrário de “Nocens” que advém de “Nocere”, isto é, gerar ou permitir o mal. Logo, a inocência não causou, não causa e nunca causará danos civilizatórios.

      Por outro lado, “Ingenuidade” advém de “Ingenuus” que quer dizer “nascido livre” e consequentemente, na cultura romana, alguém oriundo da elite… Portanto, lá, um escravo jamais seria considerado ingênuo. A não ser, é claro, se houvesse naquele Império uma mídia à brasileira (um rebotalho de duplas sertanejas denominadas Roberto&Carlos, dublês de quinta da norte-americana Bob&Carl…) que se autodefinisse “independente”, mas via lavagem cerebral gerasse  de médios energúmenos, violentos e fascistas  uma manada a crer que efetivamente pertencesse à classe dos ingênuos: os donos da boiada e da bolada.

      Ah… Como é bovina(!) a ingenuidade dessa classe média cuja face é hospedeira de um rancor colossal… Ah… como é hegemônica e espertalhona a ingenuidade dos dominantes sobre tais subseres cujo destino é a engorda  e o abate!

      Neste instante, inventei uma parábola: se Corradini com sua “Modéstia” deu transparência à pedra fria, então é possível da ingenuidade, com ousadia, dar transparência ainda que tardia à inocência citadina.



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    2. Excelente conselho sobre dicionario etimológico, Ramiro!

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    3. Já vi esse livro enquanto olhava estantes no skoob! Eu me sentia mais ou menos assim quando li "A Redoma de Vidro". Muito, muito, muito obrigada. <33
      Muito interessante esse conselho seu. Eu nunca sequer tinha ouvido falar nesse tal dicionário...
      Abraços, obrigada pela gentileza. :')))))

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    4. Mórbido demais, real demais para uma leitora de 15 anos?

      Lady Lazarus
      Sylvia Plath

      I have done it again.
      One year in every ten
      I manage it--

      A sort of walking miracle, my skin
      Bright as a Nazi lampshade,
      My right foot

      A paperweight,
      My face a featureless, fine
      Jew linen.

      Peel off the napkin
      O my enemy.
      Do I terrify?--

      The nose, the eye pits, the full set of teeth?
      The sour breath
      Will vanish in a day.

      Soon, soon the flesh
      The grave cave ate will be
      At home on me

      And I a smiling woman.
      I am only thirty.
      And like the cat I have nine times to die.

      This is Number Three.
      What a trash
      To annihilate each decade.

      What a million filaments.
      The peanut-crunching crowd
      Shoves in to see

      Them unwrap me hand and foot--
      The big strip tease.
      Gentlemen, ladies

      These are my hands
      My knees.
      I may be skin and bone,

      Nevertheless, I am the same, identical woman.
      The first time it happened I was ten.
      It was an accident.

      The second time I meant
      To last it out and not come back at all.
      I rocked shut

      As a seashell.
      They had to call and call
      And pick the worms off me like sticky pearls.

      Dying
      Is an art, like everything else.
      I do it exceptionally well.

      I do it so it feels like hell.
      I do it so it feels real.
      I guess you could say I’ve a call.

      It’s easy enough to do it in a cell.
      It’s easy enough to do it and stay put.
      It’s the theatrical

      Comeback in broad day
      To the same place, the same face, the same brute
      Amused shout:

      ‘A miracle!'
      That knocks me out.
      There is a charge

      For the eyeing of my scars, there is a charge
      For the hearing of my heart--
      It really goes.

      And there is a charge, a very large charge
      For a word or a touch
      Or a bit of blood

      Or a piece of my hair or my clothes.
      So, so, Herr Doktor.
      So, Herr Enemy.

      I am your opus,
      I am your valuable,
      The pure gold baby

      That melts to a shriek.
      I turn and burn.
      Do not think I underestimate your great concern.

      Ash, ash--
      You poke and stir.
      Flesh, bone, there is nothing there--

      A cake of soap,
      A wedding ring,
      A gold filling.

      Herr God, Herr Lucifer
      Beware
      Beware.

      Out of the ash
      I rise with my red hair
      And I eat men like air.

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    5. que doloroso :( como soaria se eu disser que sim, é real?

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  9. GIRASSÓIS PRA SEMPRE
    by Ramiro Conceição

    Não contarei os mortos de Paris,
    Nova Iorque, Rio, Oslo, Kiev ou Madri.
    Não cantarei aos mortos de Bagdá,
    Luanda, Argel, Cairo ou Tel Aviv.
    Não contarei os mortos do Haiti,
    de Caracas, Teerã, ou Marrakesh.
    Não cantarei… Por quê?... Morri.

    Ai de nós, porque a vida… estava aqui,
    está aqui e estará aqui, apesar de nós.
    Por isso, sem dúvida, eu acuso!
    Todos os assassinos de Lennon
    em todas as Brasílias do mundo.

    A grandeza de uma civilização
    não é a globalização do capital
    a matar impunemente.

    A grandeza de uma civilização
    são seios a amamentar gerações
    de construtores d’estradas entre
    estrelas, mares e palavras.

    Todavia somos ávidos por ideologias,
    aptos à imundice de tudo... Contudo,
    há uma ética, uma navalha, a separar
    canalhas - de canários.

    Eu preciso dessa ética pra viver.


    APOTEOSE
    by Ramiro Conceição

    Se não crês em mim tal qual amigo
    então não me vês, mas um inimigo
    que carregas dentro e que te devora,
    que, a te furtar, está nesse teu agora.

    Amar é não plantar carências…
    Ah, essas farpas da existência!
    Rascunhos são a nossa essência.
    Dos fracassos - se faz ciência.

    Trocar amigos por inimigos
    é do mar, com o mal, roubar o sal
    no escuro d’estrelas embrulhadas.

    Para provar que sou amigo, digo:
    amar é crer… em nossa hipótese
    e às cegas ver a nossa apoteose.







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