Você leu o excerto do livro que saiu na Piauí esse mês? A descrição da decadência física de um dos primeiro bombeiros a chegar ao local da explosão é de revirar o estômago. Meu pai leu-a antes de mim, e quando me devolveu a revista, ele tinha um olhar um pouco perdido e tudo que conseguiu articular foi um 'o cara dissolveu' meio desconexo... Quando a Svetlana ganhou o Nobel, eu fiquei um pouco desapontado. Desinformado eu era, contudo isso não me impediu de julgar precipitadamente - ah, uma escolha política, que surpresa, logo ela que estava no primeiro lugar das casas de aposta, etc etc. Mas depois de ler o que ela intitula 'Entrevista da autora consigo mesma sobre a história omitida e por que Chernobil desafia a nossa visão de mundo', todo esse pré-julgamento esvaneceu e ficou claro o porque do prêmio. Ela é, de fato, uma grande escritora. Chernobil, acredito eu, representa para nós brasileiros pouco mais do que um desastre passado numa terra longínqua. Como é fácil fazer, nós sempre esquecemos das pequenas partes que compõem as grandes tragédias dos livros de história. Svetlena, como diz em certo momento, se 'dedica aos rastros imperceptíveis da nossa passagem pela terra'. Ela se dedica a contar a história dessas pequenas partes, dos homens e mulheres que morreram como heróis de nada. O bombeiro do relato não evitou que a radiação se espalhasse, não participou da construção do sarcófago. Ele, na verdade, tornou-se o vetor da morte da própria filha. Ainda assim, ele está no panteão dos heróis de Chernobil. Não estou aqui para desmerecer a vida de Vassíli Ignátienko, o bombeiro, mas apenas para dizer o que parece me dizer a escrita de Svetlana: sua morte foi em vão, assim como as milhares de outras. Não morreram por uma causa, não morreram por quem amavam, não morreram com quem amavam. Dissolveram-se na tragédia, numa tragédia que, por mais que se procurem e julguem culpados, é a tragédia do nosso século, da nossa ciência poderosa, do nosso mundo de 7 bilhões de pessoas que precisa de energia. É a tragédia do nosso presente, mas também do nosso futuro.
Isso também me lembra, Charlles, que, se não estou enganado, li em algum lugar do seu blog que você, quando criança, morou perto de onde aconteceu o acidente com o césio-137. Ou era apenas uma (excelente) peça de semi-ficção?
Li sim na Piauí. Estou ansioso por esse livro, tanto que já o comprei (poderia pedi-lo pela cota na parceria que tenho com a Companhia das Letras, mas comprando-lo ele me chega mais rápido). Julgo que seja arrasador, poderoso, terrível, perturbador.
Assista ao vídeo documentário sobre Tchernobil que tem no youtube. É uma das coisas mais impactantes que eu já vi. Ali mostra toda a hipocrisia do estado ao enviar os mineiros e os pilotos de helicópteros para a morte. Uma metáfora mortífera sobre o fim da URSS.
É verdade sim. Eu morava de frente ao depósito de papel onde abriram a cápsula contendo o Césio. O apartamento ainda pertence à minha mãe.
Grande escritor! Não sabia de sua morte. Li apenas O fiasco. O restante da obra dele lançada no Brasil está esgotada, e é vendida por preços exorbitantes.
Charlles, eu acho que só o "sem destino", está com o preço bem elevado os demais se encontram com preços módicos, é um autor que eu tenho grande curiosidade, assim como vários outros do país dele, como Sandor Marai, Esterhazy e o Krudy.
Estou a ler esta escritora, mas O fim do homem soviético, se este é deprimente e cheio de desilusões, esta obra não deve mesmo ser nada otimista. Contudo admiro a isenção da autora que recolhe estes relatos.
Eles estão devendo o sr. Sammler já faz dois anos. Tomara que lancem nesse ano. Está em pré-venda, da Cia, o Almoço Nu; não gosto muito do Burroughs, mas os livros dele se me revelaram bons passatempos.
Curioso aqui com essa Aleksievich. Como a grana tá muito curta ler ela não é prioridade agora mas tô me coçando pra pegar logo esse livro, saber se toda essa confusãozinha – mas-ei-ela-é-só-jornalista, ah-não-ela-é-escritora-escritora-mesmo etc. etc. – se essa confusãozinha vale a pena ou é mais bobeira.
Porque é claro que podem ter nobelizado apenas porque podiam: Dario Fo e mais uns tantos. Mas lendo trechos dela imagino (sonho) que a coisa seja de qualidade parecida com o que o Eduardo Coutinho produzia por aqui, e nesse caso que deem logo mais três nóbeis pra ela e eu não vou reclamar.
Você leu o excerto do livro que saiu na Piauí esse mês? A descrição da decadência física de um dos primeiro bombeiros a chegar ao local da explosão é de revirar o estômago. Meu pai leu-a antes de mim, e quando me devolveu a revista, ele tinha um olhar um pouco perdido e tudo que conseguiu articular foi um 'o cara dissolveu' meio desconexo...
ResponderExcluirQuando a Svetlana ganhou o Nobel, eu fiquei um pouco desapontado. Desinformado eu era, contudo isso não me impediu de julgar precipitadamente - ah, uma escolha política, que surpresa, logo ela que estava no primeiro lugar das casas de aposta, etc etc. Mas depois de ler o que ela intitula 'Entrevista da autora consigo mesma sobre a história omitida e por que Chernobil desafia a nossa visão de mundo', todo esse pré-julgamento esvaneceu e ficou claro o porque do prêmio. Ela é, de fato, uma grande escritora. Chernobil, acredito eu, representa para nós brasileiros pouco mais do que um desastre passado numa terra longínqua. Como é fácil fazer, nós sempre esquecemos das pequenas partes que compõem as grandes tragédias dos livros de história. Svetlena, como diz em certo momento, se 'dedica aos rastros imperceptíveis da nossa passagem pela terra'. Ela se dedica a contar a história dessas pequenas partes, dos homens e mulheres que morreram como heróis de nada. O bombeiro do relato não evitou que a radiação se espalhasse, não participou da construção do sarcófago. Ele, na verdade, tornou-se o vetor da morte da própria filha. Ainda assim, ele está no panteão dos heróis de Chernobil. Não estou aqui para desmerecer a vida de Vassíli Ignátienko, o bombeiro, mas apenas para dizer o que parece me dizer a escrita de Svetlana: sua morte foi em vão, assim como as milhares de outras. Não morreram por uma causa, não morreram por quem amavam, não morreram com quem amavam. Dissolveram-se na tragédia, numa tragédia que, por mais que se procurem e julguem culpados, é a tragédia do nosso século, da nossa ciência poderosa, do nosso mundo de 7 bilhões de pessoas que precisa de energia. É a tragédia do nosso presente, mas também do nosso futuro.
Isso também me lembra, Charlles, que, se não estou enganado, li em algum lugar do seu blog que você, quando criança, morou perto de onde aconteceu o acidente com o césio-137. Ou era apenas uma (excelente) peça de semi-ficção?
ExcluirAlan
Li sim na Piauí. Estou ansioso por esse livro, tanto que já o comprei (poderia pedi-lo pela cota na parceria que tenho com a Companhia das Letras, mas comprando-lo ele me chega mais rápido). Julgo que seja arrasador, poderoso, terrível, perturbador.
ExcluirAssista ao vídeo documentário sobre Tchernobil que tem no youtube. É uma das coisas mais impactantes que eu já vi. Ali mostra toda a hipocrisia do estado ao enviar os mineiros e os pilotos de helicópteros para a morte. Uma metáfora mortífera sobre o fim da URSS.
É verdade sim. Eu morava de frente ao depósito de papel onde abriram a cápsula contendo o Césio. O apartamento ainda pertence à minha mãe.
Hoje morreu o Imre Kertész. Nunca o li, apesar de ter um livro dele. Você conhecia o sujeito, Charlles?
ResponderExcluirGrande escritor! Não sabia de sua morte. Li apenas O fiasco. O restante da obra dele lançada no Brasil está esgotada, e é vendida por preços exorbitantes.
ExcluirCharlles, eu acho que só o "sem destino", está com o preço bem elevado os demais se encontram com preços módicos, é um autor que eu tenho grande curiosidade, assim como vários outros do país dele, como Sandor Marai, Esterhazy e o Krudy.
ExcluirParece que o Sem destino é o melhor. Mas 250 reais não dá. Não há razão para esse preço.
ExcluirEm o Fiasco ele tem essa prosa intimista, de quem escreve para si e parece não saber do leitor. É um romance formidável.
Estou a ler esta escritora, mas O fim do homem soviético, se este é deprimente e cheio de desilusões, esta obra não deve mesmo ser nada otimista. Contudo admiro a isenção da autora que recolhe estes relatos.
ResponderExcluirPortugal está na frente de traduções dela. Um tema desse é difícil ser otimista. Bom, nada li da autora e estou ansioso. Vamos ver.
ExcluirFiquei sabendo que a Companhia das Letras vai publicar O planeta do senhor Sammler, Charlles!
ResponderExcluirEles estão devendo o sr. Sammler já faz dois anos. Tomara que lancem nesse ano. Está em pré-venda, da Cia, o Almoço Nu; não gosto muito do Burroughs, mas os livros dele se me revelaram bons passatempos.
ExcluirCurioso aqui com essa Aleksievich. Como a grana tá muito curta ler ela não é prioridade agora mas tô me coçando pra pegar logo esse livro, saber se toda essa confusãozinha – mas-ei-ela-é-só-jornalista, ah-não-ela-é-escritora-escritora-mesmo etc. etc. – se essa confusãozinha vale a pena ou é mais bobeira.
ResponderExcluirPorque é claro que podem ter nobelizado apenas porque podiam: Dario Fo e mais uns tantos. Mas lendo trechos dela imagino (sonho) que a coisa seja de qualidade parecida com o que o Eduardo Coutinho produzia por aqui, e nesse caso que deem logo mais três nóbeis pra ela e eu não vou reclamar.